1 BITENCOURT, Cezar Roberto, Código Penal Comentado, editora Saraiva: São Paulo, 2002, p. 123.
Fonte: http://www.buscalegis.ufsc.br/arquivos/Anencefalia%20e%20aborto%20por%20Fabricio%20Fazolli%20em%2002-08.htm
© 2008 - 2015. Karina Merlo & Associados. "A liberdade de manifestação é garantia constitucional que só encontra limites quando passa a violar bem maior, como, no caso, a dignidade da pessoa atacada pelo veículo de comunicação."
A
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aprovou nesta quarta-feira (27), por unanimidade, texto substitutivo a projeto do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) disciplinando a quebra, por ordem judicial, do sigilo das ligações telefônicas para investigação criminal ou para fins de instrução de processo penal. As normas abrangerão também as comunicações por meio de computador. A matéria terá que ser votada em turno suplementar, antes de seguir para o Plenário do Senado. Jarbas Vasconcelos pediu ao governo que se empenhe para que a proposição seja aprovada com urgência pelo Senado e pela Câmara dos Deputados.O texto apresentado nesta quarta-feira pelo relator, senador Demóstenes Torres (DEM-GO), foi construído em acordo com o ministro da Justiça, Tarso Genro, e estabelece, entre outras medidas, que a quebra de sigilo não será permitida na investigação de crimes de menor potencial.
Define também que o pedido de quebra de sigilo das comunicações terá que ser formulado por escrito ao juiz, por meio de requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial. Esse pedido deverá conter informações como a descrição precisa dos fatos investigados e a indicação do nome da autoridade que está investigando o caso. Além disso, deverá informar o prazo de duração da quebra, que não poderá exceder a 60 dias, sendo permitida prorrogação por igual período.
O texto substitutivo define também as sanções penais para quem violar o sigilo de comunicação telefônica, de informática ou telemática sem autorização judicial. Quem descumprir a regra poderá pegar a pena de reclusão de dois até quatro anos, além de pagar multa. A pessoa que violar o segredo de justiça e divulgar as informações também estará sujeita a essas penas. Se o crime for praticado por funcionário público, a pena poderá ser aumentada de um terço até a metade.
O Executivo também estará autorizado a instituir sistema centralizado de informações sobre quebra de sigilo de comunicações.
A profissão de advogado é controvertida. Muitos a elogiam e muitos a condenam. É, porém, a única que consta na nossa Constituição Federal, como um dos pilares da Justiça e indispensável à sua administração. Quem escolher a profissão de Advogado, deverá estar preparado para não ter reconhecida sua competência, mesmo “dando seu sangue” por uma causa – o cliente sempre achará que, afinal, era um direito dele! - e, não obtendo o sucesso esperado, saber que a culpa sempre será do Advogado, não importando a dificuldade da própria causa e os elementos que a compõem. Portanto, terá que ter desprendimento. Essa “ingratidão” não deverá, no entanto, ser motivo de desgosto. Deve constar nas habilidades deste profissional o saber lidar com esta situação e sempre fazer o melhor. Haverá sempre as exceções que trarão a satisfação e o orgulho de ser um Advogado. Não se nega que muitos profissionais contribuem para a má visão que muitos têm do advogado, pois agem irresponsavelmente, pensando apenas em auferir lucros, sem se importar com a moralidade ou a integridade dos seus atos. Isso, porém, não interessa àqueles que tomam sua profissão, e a tudo, como a expressão da manifestação do que há de melhor em si, pois dentro da sua atuação profissional ou de suas habilidades em qualquer atividade, está a manifestação da própria vida. Assim, é necessário que se defenda a honra e a importância da profissão de Advogado, o que é feito pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, e pelos profissionais que a compõem. Temos, pois, o Código de Ética, que norteia os desavisados, não sendo tão necessário aos que cumprem com suas obrigações e têm dentro de si a percepção e a consciência dos requisitos dignificantes que são necessários à sua atuação. Estes, além de bons advogados, são bons homens. Levemos em consideração que depende de cada advogado a manutenção da boa fama e reputação de toda a classe. Apesar de toda a balbúrdia e intenções contrárias, a Advocacia é dignificante e possui tradição, já que há uma história da Advocacia, ordem social e jurídica no País. Aquele que escolhe ser advogado deve saber que a partir do momento em que estiver apto a exercer sua profissão, ou seja, após realizado o exame da Ordem dos Advogados do Brasil, obrigatório em todo o País, estará imbuído de responsabilidades. Ao falar, ao comportar-se, ao agir, ao escrever, ao opinar, ao atuar, não poderá mais portar-se como o estudante que, anos atrás, ingressou nas lidas dos estudos jurídicos em uma Faculdade ou Universidade. Nem mesmo como o mesmo homem. Já terá de ter-se adaptado ao mundo jurídico, moldado-se às suas exigências, fato que será fator de sucesso na sua profissão. Se você detesta usar terno, gravata ou desgosta-se de leituras, se é impaciente demais, ou se aborrece facilmente, terá vida curta dentro da Advocacia. A menos que uma das suas qualidades seja a capacidade de adaptar-se. Fonte: PARENTONI, Roberto Bartolomei. Profissão: Advogado(a). Jus eundi, Rio de Janeiro, mai. 2008.
A Advocacia Criminal
A Advocacia Criminal, a qual muitos se referem como “o mais apaixonante ramo do direito”, é uma área muito importante e exige de seus profissionais muitas habilidades que diferem das exigidas pelos profissionais de outras áreas, como a cível e a trabalhista, por exemplo.
Algumas das habilidades que os Criminalistas devem possuir, além da vocação, são os conhecimentos científicos sobre criminologia e medicina legal, além de oratória, caso desejem atuar no Tribunal do Júri. Não podemos esquecer, ainda, que as habilidades de psicologia também são bem vindas, uma vez que tratará sempre com pessoas e os problemas que as afligem, geralmente graves.
Algumas qualidades são essenciais e, segundo Manoel Pedro Pimentel, ao Advogado Criminalista cabe : “coragem de leão e brandura do cordeiro; altivez de um príncipe e humildade de um escravo; fugacidade do relâmpago e persistência do pingo d’água; rigidez do carvalho e a flexibilidade do bambu”.
O estudo, conhecimento da alma humana, leitura de bons livros fora de temas jurídicos – que agreguem valores, ajudem no aumento do vocabulário -, conhecimento das leis, jurisprudências e arestos dos Tribunais, perspicácia na análise das provas, exercício da oratória, atenção a tudo e a todos, boa impressão pessoal, tato, diplomacia, capacidade de convencimento - de forma agradável e precisa, são ações indispensáveis ao Advogado Criminalista.
O próprio Curso de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais está incurso na área de Ciências Humanas. É impossível, pois que uma pessoa que nada compreenda da natureza humana, tampouco tenha um espírito capaz de se sensibilizar com a tragédia humana, possa servir nos balcões da Advocacia, especialmente a Criminal.
Aquele que escolhe esta área para atuar, deverá sempre ter em mente que estará defendendo a pessoa e seus direitos e não o crime do qual o cliente é acusado. O Advogado Criminalista é a voz, cabeça e mãos dos direitos que cabem a qualquer pessoa.
O processo criminal sempre trará em seu seio histórias trágicas, da vítima e do acusado, pois que não é menos trágico o cometimento de um crime, apesar de parecer, num primeiro plano, que a vítima é a que mais “perde”.
O Advogado Criminalista tem a função e obrigação de analisar as provas diligentemente, além de verificar se o processo prima pela regularidade perfeita, pois disso depende que seja feita a justiça e é a garantia de que defesa de seu cliente foi realizada de forma primorosa e eficaz.
Os Advogados Criminalistas precisam “ter estômago”, como dizem, serem combativos, guerreiros e corajosos, trazerem consigo um espírito de luta, não só para lutar, dentro do processo criminal a favor de seu cliente, contra as cotas da acusação ou eventuais injustiças das sentenças, mas também para enfrentar a oposição ainda maior da sociedade que muitas vezes não compreende suas ações.
Os desavisados e ignorantes têm em mente que o Advogado Criminalista “defende bandidos”, solta os criminosos que a polícia se esforça para prender, o que não é verdade.O Advogado Criminalista defende os direitos de toda pessoa humana, garantidos pela Constituição Federal, em seu artigo 5º, assim como pugna, como um bom e combativo advogado, para que todos os procedimentos e leis sejam cumpridos quando uma pessoa sofre uma acusação ou é recolhida à prisão.
Não cogitam os mesmos desavisados que muitos inocentes sofrem a prepotência da ação policial, que às vezes agem fora das normas e preceitos legais, consciente ou inconscientemente, não importa. Importa que o Advogado esteja ali para lutar pelos direitos da pessoa. Todos os desavisados com certeza gostariam que assim se procedesse com eles próprios, caso a “água batesse em suas costas”.
O advogado criminalista lida com a liberdade das pessoas, com a repercussão das ações criminosas praticadas e as agruras da alma humana. Quão difícil e complicada a alma humana com todas suas subjetividades e relatividades!
A fama que leva o Advogado Criminalista de abrir as portas das cadeias para os clientes criminosos é absolutamente maldada, uma vez que o Advogado é uma das peças da constituição judiciária, não tendo esse poder, nem age injustamente, pois outras peças agem dentro do processo, com igual ímpeto de realizar bem as suas obrigações.
Se por muitas vezes o Advogado Criminalista sofre as agruras da profissão, muitas recompensas ele também agrega, principalmente quando consegue, agindo com integridade e esforço, evitar uma injustiça, salvar da prisão um inocente, abrandar uma pena severa demais.
Aquele que escolhe a profissão de Advogado, e Criminalista, deve, pois, orgulhar-se das habilidades que possui, de ter escolhido uma profissão digna e de ajudar a manter a ordem social e jurídica do seu País, auxiliando na manutenção da ordem e da paz.
Não por menos, os nomes lembrados e laureados são nomes de Criminalistas consagrados através do tempo, que entram para a História, não ocorrendo o mesmo com grandes civilistas. Aqueles ganham o direito a esta posteridade exatamente por ousar agir em uma causa impopular, enfrentando toda uma sociedade indignada, na defesa do acusado. Coloca-se, naquele momento ao lado do mais fraco e desafortunado, não porque defende a ação da qual o cliente é acusado, mas por dever ético, profissional e humano. É preceito Constitucional que ninguém pode ser condenado sem defesa.
Ainda que o crime seja nefasto, em nenhum momento o conceito atribuído ao cliente deve se confundir com a reputação do advogado.
Mesmo assim, os Advogados Criminalistas sofrerão muitas vezes com os abusos de poder e a pressão da sociedade, que têm início junto aos seus clientes e mistura-se à personalidade do defensor, o que resulta em situações em que os profissionais vêem-se forçados a violar o sigilo profissional, através de buscas ilegais em seus escritórios.
Há, no entanto, a jurisprudência a garantir que os advogados têm o direito de exercer com liberdade a profissão em todo o território nacional, na defesa dos direitos ou interesses que lhe forem confiados; fazer respeitar, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade do seu domicílio, do seu escritório e dos seus arquivos, como coisas intocáveis.
O artigo 7º, II, do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil garante o direito do advogado de ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca e apreensão determinada por magistrado.
Por fim, a Advocacia Criminal é personalíssima e não se organiza em grandes escritórios ou empresas. Não há clientela, como no caso dos Civilistas, Tributaristas e Advogados Trabalhistas, por exemplo.
Faço minhas as palavras de Sir Francis Bacon: “Conhecimento é Poder”
Fonte: PARENTONI, Roberto Bartolomei. A Advocacia Criminal. Jus eundi, Rio de Janeiro, mai. 2008.
Disponível em: http://www.juseundi.com.br/artigo/artigo.asp?id=55. Acesso em: 18 ago. 2008
Novas leis para consolidar o Estado de Direito
Como acontece em momentos de crise e de luta contra o crime organizado e a corrupção, enfrentamos o dilema de como combater esses males, sem nos desviar do Estado de Direito, que exige o respeito integral à Constituição e aos direitos e garantias individuais. Essa questão não é única do Brasil. Há inúmeros exemplos no mundo, em países e regimes democráticos, como nos EUA, onde o Ato Patriótico, com o pretexto de combater o terrorismo, na prática, autorizou a suspensão das garantias individuais. De forma indireta, autorizou o uso da tortura e a prisão sem prazo e sem culpa até que a Suprema Corte começasse a derrubar essas barbaridades e impusesse de novo o império das garantias constitucionais.
Nada, nem mesmo o terrorismo, pode justificar que para combater o crime ou o delito, governos rompam com a constituição e suas garantias. No Brasil, não está longe a Ditadura Militar que, a pretexto de combater o que chamavam de corrupção e subversão, criou um Estado que subverteu a ordem legal e constitucional e permitiu, por omissão, leniência e autoritarismo, uma corrupção como o país nunca tinha visto, já que não havia nem a fiscalização do legislativo, nem independência do judiciário e muito menos liberdade de informação.
Faço o apanhado histórico para chamar a atenção sobre os riscos que corremos hoje em nosso país com a escalada de abusos de autoridade e de ilegalidades praticadas por setores do Ministério Público, da Polícia Federal e mesmo da Magistratura, a pretexto do combate à corrupção. A própria mídia não fica isenta de culpa ao tomar partido na disputa política e dar dois pesos e duas medidas às informações sobre denúncias e escândalos, privilegiando e estimulando matérias contra o governo e o PT, fazendo campanhas abertas pela punição sem julgamento de acusados ou apenas suspeitos, mesmo sem provas.
A justificativa agora são os novos tempos que exigiriam leituras flexíveis da Constituição e dos Direitos Individuais, permitindo a delegados e juízes o ilimitado das interceptações telefônicas, buscas e apreensões, prisões provisórias e preventivas, denúncias, ou seja, transformando as investigações e inquéritos num verdadeiro julgamento onde não há segredo de Justiça e nem mesmo sigilo do processo ou das informações protegidas por lei.
Apesar do consenso nacional de que é necessário combater a corrupção, aos poucos se forma no país a convicção de que algo está podre apesar dos fins nobres da cruzada anti-corrupção de alguns delegados e juízes. Os vazamentos estão se tornando regra e as escutas telefônicas passaram a ser, para muitas autoridades, o único meio de investigação.
No momento em que surgem propostas, no Judiciário, no Executivo e no Legislativo – cuja expressão maior foi a tentativa da CPI dos "grampos", rejeitada pelo STF, de acessar os dados que as telefônicas têm dos 409 mil que foram grampeados só em 2007 – ficamos sabendo que um juiz de São Paulo, apesar de seus desmentidos, autorizou um delegado da Polícia Federal a ter acesso a senha para todos os telefones que ligaram para os 409 mil interceptados. É uma violação - mais uma - aberta e frontal à Constituição e à lei que autoriza as interceptações telefônicas. O Brasil já viveu três décadas de sua vida republicana sob ditadura e não pode ter medo da democracia e do Estado de Direito. Deve e precisa de uma nova lei de interceptação telefônica e de uma rigorosa legislação contra o abuso de autoridade para que a luta e o combate necessários e exigidos pela sociedade contra a corrupção e o crime organizado se dêem dentro da lei e da Constituição.
(artigo publicado no Jornal do Brasil, em 07 de agosto de 2008)
Desafiados pela Polícia Federal (PF), que ontem algemou 32 presos da Operação Dupla Face, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aprovaram hoje em tempo recorde para os padrões da Corte uma súmula vinculante que prevê punições severas para policiais e autoridades que algemarem pessoas sem necessidade e a responsabilização do Estado. Além disso, os agentes terão de justificar por escrito o motivo para o uso de algemas. Quem for vítima de abuso pode reclamar diretamente ao STF. Num único dia, os ministros redigiram e aprovaram o texto.
Na opinião de ministros do STF, a Operação Dupla Face foi um exemplo de afronta ao tribunal que, na semana passada, decidiu que apenas em casos excepcionais um preso deve ser algemado. A operação foi deflagrada ontem para desmontar uma quadrilha suspeita de cobrar propinas e de cometer fraudes para acelerar processos de certificação de imóveis rurais no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e na Receita Federal.
De acordo com a súmula aprovada hoje, o agente público que determinar e executar a colocação de algemas em um preso terá de justificar por escrito a medida. Se o ato for considerado abusivo, o policial ou autoridade poderá responder administrativa, civil e criminalmente. A súmula, que deve obrigatoriamente ser seguida, também prevê a anulação da prisão ou do julgamento no qual ocorrer o uso abusivo das algemas.
"A súmula não pode ter caráter meramente retórico. A imposição de algemas transforma-se num ritual de degradação moral", afirmou o ministro Celso de Mello. Para ele, tem ocorrido "um exercício de insensatez e de desafio à autoridade do Supremo Tribunal Federal". Segundo o ministro, usar algemas sem necessidade é um ato "criminoso". Pela súmula, somente podem ser usadas algemas em caso de resistência do preso ou risco de fuga ou perigo à integridade física do investigado ou de outras pessoas. A súmula aprovada tem de ser seguida por toda a administração pública.
Filha
O STF havia decidido na semana passada editar texto disciplinando o uso das algemas. A decisão foi tomada durante um julgamento em que o plenário anulou a condenação do pedreiro Antonio Sérgio da Silva a 13 anos e meio de prisão por homicídio. Durante o julgamento no Tribunal do Júri de Laranjal Paulista, no interior de São Paulo, o pedreiro ficou algemado.Os ministros entenderam que a imagem do pedreiro perante os jurados foi prejudicada. Curiosamente, a decisão de algemar o preso partiu da então juíza do município, Glaís de Toledo Piza Peluso, filha do vice-presidente do STF, Cezar Peluso. De acordo com a assessoria de imprensa do Supremo, o ministro não sabia que se tratava de uma decisão de sua filha. Ele, inclusive, criticou duramente a decisão da juíza, dizendo que tinha partido de um magistrado inexperiente.
Fonte: O Globo On Line de Quarta, 13 Agosto de 2008
http://br.noticias.yahoo.com/s/13082008/25/politica-stf-aumenta-puni-abusos-no-algemas.html
Para a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção á Infância e à Adolescência (ABRAPIA), por não existir uma palavra na língua portuguesa capaz de expressar todas as situações de bullying, as ações que podem estar presentes no bullying são: colocar apelidos, ofender, zoar, gozar, encarnar, sacanear, humilhar, fazer sofrer, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar, perseguir, assediar, aterrorizar, amedrontar, tiranizar, dominar, agredir, bater, chutar, empurra, ferir, roubar e quebrar pertences (04).
É comum entre os alunos de uma classe a existência de diversos conflitos e tensões. Há ainda inúmeras outras interações agressivas, às vezes como diversão ou como forma de auto-afirmação e para se comprovarem as relações de força que os alunos estabelecem entre si. Caso exista na classe um agressor em potencial ou vários deles, seu comportamento agressivo influenciará nas atividades dos alunos, promovendo interações ásperas, veementes e violentas. Devido ao temperando irritadiço do agressor e á sua acentuada necessidade de ameaçar, dominar e subjugar os outros de forma impositiva pelo uso de força, as adversidades e as frustrações menores que surgem acabam por provocar reações intensas. Ás vezes, essas reações assumem caráter agressivo em razão da tendência do agressor a empregar meios violentos nas situações de conflitos. Em virtude de sua força física, seus ataques violentos mostram-se desagradáveis e dolorosos para os demais. Geralmente o agressor prefere atacar os mais frágeis, pois tem certeza de dominá-los, porém não teme brigar com outros alunos da classe: sente-se forte e confiante (05).
Quanto aos demais alunos, acabam se tornando testemunhas, vítimas e co-agressores dessa cruel dinâmica. Se não participarem do bullying, podem ser as próximas vítimas. Não denunciam e se acostumam com essa prática violenta, podendo até encará-la como normal dentro do ambiente escolar (e um dia até no ambiente de trabalho). O bullying acaba criando um ciclo vicioso, arrastando os envolvidos cada vez mais para o seu centro.
O sofrimento emocional e moral (até físico eventualmente) da vítima é claro. É comum que a vítima mantenha a lei do silêncio, pois, na maioria das vezes, as agressões são apenas morais e não deixam vestígios. O fenômeno bullying, apesar de ser antigo, deve ocorrer com mais regularidade do que imaginamos. Será que um conselheiro tutelar, um assistente social, membro do Ministério Público ou Poder Judiciário saberá lidar de forma efetiva e adequada com essa situação? Estamos preparados para dar uma resposta efetiva para reduzir o bullying?
O fenômeno bullying estimula a delinqüência e induz a outras formas de violência explícita, produzindo, em larga escala, cidadãos estressados, deprimidos, com baixa auto-estima, capacidade de auto-aceitação e resistência á frustração, reduzida capacidade de auto-afirmação e de auto-expressão, além de propiciar o desenvolvimento de sintomatologias de estresse, de doenças psicossomáticas, de transtornos mentais e de psicopatologias graves. Tem, como agravante, interferência drástica no processo de aprendizagem e de socialização, que estende suas conseqüências para o resto da vida podendo chegar a um desfecho trágico (06). Em situações de ataques mais violentos, contínuos e que causem graves danos emocionais, a vítima pode até cometer suicídio ou praticar atos de extrema violência.
O profissional do Direito (juiz de direito, promotor de justiça, advogado ou delegado de polícia), ao se deparar com um problema de bullying deve ter estar aberto a todas alternativas possíveis que possam ser colocadas para a solução do problema. Não é o princípio de autoridade por si só, que poderá acabar com essas ocorrências num determinado ambiente escolar - mente aberta para todas as possibilidades de solução do conflito e interação com os alunos do meio escolar. Sem a participação efetiva dos estudantes na reconstrução da situação problemática a resposta imposta pode ser temporária e não resolver o problema das vítimas. Uma resposta imposta do meio externo tende a não ser aceita pelos estudantes em médio prazo.
Para romper aos poucos com o ciclo vicioso, cada parte deve examinar sua própria contribuição involuntária para o padrão e fazer algo diferente que tenha mais chances de reduzir o problema exteriorizado. É necessário que abandonem essa postura de culpar uma à outra e caminhem em direção a uma compreensão mais profunda do problema que há entre elas (07). Há necessidade de se tratar com a direção da escola a capacitação dos funcionários e professores para lidar com o tema e buscar o máximo possível manter um diálogo aberto e franco com as crianças e adolescentes envolvidos, com o intuito de se procurar uma solução que seja aceita pelo grupo e que seja internalizada e duradoura para aquele ambiente escolar.
É preciso buscar um diagnóstico do bullying naquela realidade escolar local. O esclarecimento pode, em muitos casos, facilitar o controle dessas situações. Para que isso possa ser conseguido é necessário que haja um diálogo franco entre os envolvidos. Isso evitará que os envolvidos tenham uma mensagem da sociedade que os problemas devem ser resolvidos com violência ou com a anulação moral dos mais fracos. Há ainda o problema da formação de grupos, até de gangues, pela ação do agressor, que podem futuramente partir para a prática de atos de delinqüência. A atuação preventiva nesses casos é a melhor saída. Devemos coibir essas práticas e propagar, em vez da violência, a tolerância e a solidariedade. Agindo assim contribuiremos para reduzir a prática futura de crimes violentos decorrentes das situações de bullying.
Esse texto não tem como objetivo esgotar o assunto, mas trazer considerações iniciais sobre um fenômeno corriqueiro e que não recebe o tratamento adequado pelo Poder Público no Brasil. Não seria diferente. Como podemos resolver uma situação se nem sabemos que ela existe? Façamos agora a nossa parte.
* O artigo do Prof. Lélio sobre bullying ganhou destaque na capa da revista jurídica Consulex no mês de julho de 2008.
** Acesse esse artigo na sua origem: http://www.novacriminologia.com.br/artigos/leiamais/default.asp?id=1955(01) CALHAU, Lélio Braga. Resumo de Criminologia. Rio de Janeiro, Impetus, 2006, p. 10.
(02) CALHAU, Lélio Braga. Criminalidade, infância e a Psicologia. Jornal Hoje em Dia, Belo Horizonte, Minas Gerais, 01.12.06, página 02. Também disponível no site www.novacriminologia.com.br
(03) FANTE, Cleo. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas, Verus, 2005, p. 27.
(04) ABRAPIA – Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção á Infância e á Adolescência. Disponível na Internet: http://www.bullying.com.br/BConceituacao21.htm#OqueE
(05) FANTE, Cleo, op. cit, p. 47-48.
(06) PEDRA, José Augusto em prefácio da obra constante na nota 03 de Cleo Fante, p. 9-10.
(07) BEAUDOIN, Marie-Nathalie; TAYLOR, Maureen. Bullying e desrespeito: como acabar com essa cultura na escola. Tradução de Sandra Regina Netz. Porto Alegre, Artmed, 2006, p. 82.