quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Bahia só perde para SP em denúncias de pedofilia


por Marcelo Brandão e Felipe Corazza

A Bahia ocupa o segundo lugar no país em número de denúncias de violência sexual contra criança, segundo dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. O estado possui 10.424 registros de denúncia e perde só para São Paulo, com 13.949, entre maio de 2003 e agosto de 2009.

A Bahia fica à frente de São Paulo percentualmente, quando comparada a quantidade de denúncias em relação à população. Para cada grupo de 100 mil habitantes, ocorrem 74,4 denúncias na Bahia, enquanto no estado paulista são registradas 35,7.

A população baiana é de cerca 14 milhões, enquanto São Paulo tem 39 milhões. Apenas na segunda-feira (14), dois casos de pedofilia vieram à tona na Bahia. Além do estudante de medicina Diogo Lima, 22, flagrado com três crianças na cama, outro episódio ocorreu na cidade de Itamaraju, no extremo sul do estado. O técnico em eletrônica Guilherme Pires, de 58, foi preso sob a acusação deter violentado sexualmente uma garota de 12 anos.

O psiquiatra Irismar Oliveira, professor titular de psiquiatria da Ufba, explicou que a pedofilia é um tipo de perversão sexual causada por um um transtorno psiquiátrico. Segundo o médico, a medicina não sabe ao certo a origem da doença, que não tem cura, mas pode ser controlada com remédios e tratamento. Pessoas podem desenvolver a patologia por traumas ocorridos na infância, mas precisam ter uma propensão, explicou Oliveira. “Pedófilos precisam de ajuda médica, não apenas punição”, explicou o psiquiatra.

O psiquiatra Antônio Teixeira Lobo Júnior, apontado por Diogo como o médico que o trata, foi procurado pelo CORREIO, mas disse que não poderia comentar o assunto, alegando a ética médica do sigilo relativo ao paciente. A mãe do estudante também foi localizada no consultório do psiquiatra, na região da Avenida Garibaldi, ontem (14) à tarde, quando tentava obter um relatório médico sobre a doença do filho, mas não quis comentar o caso. Duas amigas que a acompanhavam disseram que a mãe de Diogo não tinha condições emocionais de falar.

Arquivos tinham dados de vítimas
Organizado, Diogo Nogueira mantinha em seu computador pessoal pastas com os arquivos de cada uma de suas vítimas. Além das fotos, ele reunia escritos sobre como foi o primeiro encontro, o comportamento da criança e como foram os abusos. Há exemplos de crianças, que são “acompanhadas” pelo universitário anualmente - entre elas, a irmã.

O computador foi apreendido no village da mãe de Diogo. Os policiais encontraram na casa calcinhas e cuecas infantis, vibradores, dezenas de vídeos pornográficos, e pirulitos em forma de órgão sexual. “Um pai contou que o filho teve febre por uma semana e que ninguém entendeu o motivo”, contou um policial. Com a divulgação, a Polícia Civil acredita que novos casos podem aparecer também no condomínio onde Diogo morava, no Imbuí.

Colegas sem acreditar
Um aluno estudioso, extremamente inteligente e uma pessoa educada, acima de qualquer suspeita. Esse foi o perfil do estudante de medicina Diogo Moreira Nogueira Lima, 22 anos, descrito por colegas de sala, no curso da Ufba. Foi uma surpresa para toda a turma, ninguém nunca tinha percebido qualquer comportamento anormal, disse um colega que preferiu não se identificar.

Ontem (14) à tarde, o principal assunto das conversas entre alunos era a prisão do estudante de medicina. Entre os colegas de sala, jovens que estudavam com Diogo demoraram até de acreditar na notícia da prisão dele sob acusação de pedofilia. “Quando a gente soube através da imprensa, chegamos a duvidar que fosse verdade”, contou o estudante de medicina H.M.S., 23.

Diogo era mais próximo de duas colegas de sala, sendo que uma delas chegou a passar mal quando soube do caso e nem conseguiu assistir aula. Nem sob pressão o rapaz perdia a calma, contou outro colega. O acusado também nunca havia demonstrado qualquer sinal de perversão sexual, tendo inclusive já paquerado uma colega de curso, revelou uma aluna com quem o acusado estudava.

Descrito como um aluno extremamente inteligente, Diogo chegou a passar no vestibular de direito da Ufba, mas optou por medicina, onde sua preferência eram urologia e cirurgia.

Quando teve início sua atração por crianças? Você lembra?
Fui uma criança inocente até os 11, 12 anos, sempre tive uma educação excepcional. Se fui violentado, não lembro. Começou quando virei adolescente - momento da vida quando demonstramos interesse por um determinado parceiro. Mas eu não sentia isso. Era estranho para mim, não conhecia ninguém assim. Consegui manter o controle até os 15, 16 anos.

O que mudou?
Eu me sentia atraído, sempre gostei. Eu não conseguia parar. Surgiu não sei de onde, nem sei como evoluiu. Já tive relacionamentos com meninas. E então tentei achar uma válvula de escape na medicina, tentar entender. Eu ia começar um estágio no Hospital Geral do Estado, na central de regulação de órgãos. Tento achar uma explicação, fazer uma autoterapia. Na verdade quero que o que aconteceu comigo ajude a tornar este assunto menos negligenciado. Ninguém se interessa em pesquisar a origem de um monstro.

Você tinha interesse por pediatria?
Já quis fazer pediatria, urologia, cirurgia. Mas cheguei à conclusão que, junto com a psiquiatria, (a pediatria) era inviável. Mas quando atendi crianças em ambulatórios era um atendimento saudável.

Onde denunciar
Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes - 100
Delegacia de Repressão a Crimes Contra Criança e Adolescente (Derca) - 3116-2151/2153
Serviço de Atenção a Pessoas em Situação de Violência Sexual (Viver) - 0800-284-2222
Abuso sexual
106.482 - Total de denúncias recebidas no Brasil de maio de 2003 a agosto de 2009
10.424 - Total de denúncias recebidas na Bahia de maio de 2003 a agosto de 2009
3.783 - Total de denúncias recebidas em Salvador de maio de 2003 a agosto de 2009
900 - Total de denúncias recebidas em Salvador entre janeiro a agosto de 2009

Fonte: Correio24horas
(Notícia publicada na edição impressa do dia 15/09/2009 do CORREIO)

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