domingo, 27 de setembro de 2009

Princípio da bagatela é aplicado em caso de violência doméstica no TJ/MS


"É certo que por muitas vezes o rigorismo da lei não faz justiça ao caso concreto. Dar ao caso concreto o justo julgamento é o papel do Poder Judiciário, é a função dos tribunais. Caso contrário, para que servem os juízes?". Esta observação faz parte do voto do des. Romero Osme Dias Lopes, relator da Apelação Criminal, julgada na sessão do dia 20/7, da 2ª turma Criminal do TJ/MS.

Conforme os autos do processo, V. B da S. foi condenado à pena de 11 meses de detenção, em regime semi-aberto, por suposta infração ao disposto no art. 129, § 9º e art. 163, § único, I, do CP, os quais dispõem sobre violência doméstica - lesões corporais, Lei Maria da Penha - e destruição de coisa alheia, com violência à pessoa ou grave ameaça.

Houve a condenação em virtude de um fato ocorrido no dia 7 de abril de 2007, quando o ora apelante, sob o efeito do uso de drogas e mediante violência leve, adentrou na casa de sua ex-companheira e a agrediu fisicamente, danificando, ainda, parte de sua mobília.

Segundo o julgador, a materialidade e a autoria dos crimes encontravam-se suficientemente comprovadas no processo, e embasadas na confissão parcial do acusado. No entanto, o relator segue seu voto aduzindo que as consequências dos delitos foram mínimas, os danos materiais atingiram pouco mais que o valor do salário mínimo vigente à época (R$ 380,00) e a vítima teria, em 15 de janeiro de 2008 – ou seja, após os acontecimentos – reatado com o réu, passando novamente a conviver em união estável.

Como se não bastasse, a própria ofendida salientou que os fatos ocorreram quando o seu companheiro fazia uso de entorpecentes e bebidas alcoólicas. Todavia, ele passou a frequentar tratamento e se recuperou. Finalizou que, fora dos vícios, seu amásio revelou-se pessoa trabalhadora, afável, e que não seria de seu interesse vê-lo condenado pelos fatos narrados na denúncia.

Estes aspectos fortaleceram a posição do relator para que, no caso, fosse aplicado o "princípio da insignificância" ou "bagatela imprópria", em consonância com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, embasado em consistentes posições doutrinárias – dentre os quais podem-se citar Luiz Flávio Gomes, Paulo José da Costa Júnior, José Antônio Paganella Boschi e Santiago Mir Puig. Pretendeu o magistrado a aplicação da melhor punição ao acusado, ou "aquela que seja suficiente para a reprovação do ato criminoso, que é uma satisfação à vítima e à sociedade".

Segue seu voto afirmando que a função da pena é proporcionar a reintegração do apenado ao meio social, pondo em dúvida se no caso em questão, seria prudente restringir a liberdade de V. B da S., em vista da situação na qual aponta sua total recuperação. Concluiu que manter a sentença condenatória a contragosto da vontade atual da companheira (e única vítima, haja vista que os delitos não importaram em demais consequências à sociedade) seria afrontar "valores que não podem ser esquecidos no âmbito da família, como a busca da harmonia do lar e a superação efetiva de situações em que houve violência ínfima".

Ressaltou, ainda, o desembargador que: se a palavra da vítima serviu para acusar o réu, ela também deve ser levada em conta para fragilizar a acusação, cuja continuidade irá atrapalhar a própria relação do casal. E, ainda, o acusado era réu primário, de modo que pode usufruir deste benefício, até mesmo porque "o Poder Judiciário não pode ser usado para punir/prejudicar cidadãos em razão de brigas superadas de casais. Deve-se respeitar o princípio da intervenção mínima".

Diante das considerações expostas, o relator deu provimento à apelação criminal para aplicar a "bagatela imprópria", mantendo a decisão condenatória, deixando, em contrapartida, de aplicar a reprimenda imposta (11 meses de detenção no regime semi-aberto), observando os princípios da irrelevância penal do fato e da desnecessidade da aplicação concreta da pena. Os desembargadores Marilza Lúcia Fortes e Claudionor Miguel Abss Duarte acompanharam o relator.

Apelação Criminal : 2009.011866-5

Fonte: Migalhas

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