sexta-feira, 5 de junho de 2009

Direito à dignidade humana: acessibilidade é mais do que rebaixar calçadas

por Karina Merlo
Em novembro de 2007, eu participei do II Seminário sobre o Projeto de Lei do Estatuto da Pessoa com Deficiência, realizado auditório do Ministério Público do Estado da Bahia. Foi uma audiência pública, na qual vários grupos se manifestaram através dos seus representantes. O que mais me impressionou foi a oportunidade de verificar que as dificuldades dos deficientes físicos não se restringiam ao que vemos, raramente, acontecer visualmente "de fato" no nosso dia a dia.

Ser deficiente físico é uma luta constante de superação das suas limitações e aceitação das suas dificuldades, e acima de tudo, é lutar como herói para sobreviver no campo de guerra dos "normais". O descaso da sociedade e do Estado é praticamente total: além da discriminação de se olhar para um deficiente como um "coitado", as pessoas dissimulam, não ajudam, não interferem, não... nada! Os privilegiados seres humanos "normais" tornam-se deficientes visuais, fingindo não enxergar as dificuldades dos seus irmãos, pelo simples fato de não quererem perder o seu tempo em serem pessoas humanamente melhores.

Além das dificuldades físicas para se locomoverem pela cidade, o deficiente físico sofre discriminações das mais perversas possíveis: são preteridos do mercado de trabalho, despendem de maior dedicação dos seus entes para os seus afazeres domésticos (às vezes se achando até um fardo, desnecessariamente), sofrem com o desrespeito da população em seus direitos (a pessoa normal não pode ver um "caixa" sem filas destinado ao deficiente, pois se acha no direito de ser atendido e, o deficiente físico, ao chegar, "que espere"), e eu acabo por me perguntar: o mundo é tão desumano assim, cuja básica educação e cordialidade desapareceram por completo?

O descaso é tão absurdo que, confesso, eu nunca tive acesso a um livro em braille. Na minha faculdade, pensando sobre o tema hoje para aqui um pouco me espressar, tive a lucidez de solicitar um livro em braille para uma consulta. Uma faculdade das mais embasadas em trabalhar valores humanos em Salvador, não tinha um exemplar para deficientes visuais. Resumindo minha conclusão: não posso ter nenhum colega deficiente visual nessa instituição tão bem conceituada na Bahia. Daí vocês perceberem a sutileza dos impedimentos de um deficiente se desenvolver intelectualmente.

A dificuldade permeia até os mais nobres meios de comunicação: a televisão. Eu não vejo novela (o tempo não me permite) mas quem pode acompanhar os programas diários televisivos destinados à informação e ao lazer talvez entenda a discriminação a qual me refiro. Não há tradução simultânea para os surdos e, nem o básico de curtir um pouco de TV eles podem usufruir. A não ser que queiram acompanhar o desenvolvimento das ações políticas e legislativas do Brasil, pois só a TV Senado e TV Câmara dispõem dessem recursos.

E as cotas para deficientes nos concursos? Mais uma vez terminam por serem preteridos pela capacidade dos "normais" 'pelo bem da Administração Pública'. Como se não bastassem as dificuldades inerentes ao seu estado físico, os deficientes se deparam com a lei que lhes favorece sendo burlada todos os dias.

Só quem pode falar com excelência sobre o assunto é um próprio deficiente, enquanto eu me limito a fazer esses breves comentários.

Leiam o artigo de Lílian Carla de Oliveira e se aprofundem no tema:

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