por Eudes Quintino de Oliveira Júnior* Enquanto a palavra sequestro no vernáculo exprime o ato pelo qual se priva uma pessoa de sua liberdade, mantendo-a em local onde não possa sair livremente (HOUAISS), na terminologia jurídica, no campo penal, evidencia-se pela privação ilegal da liberdade imposta por quem não exerça qualquer soma de autoridade pública, praticando, desta forma, ilícitos contra o patrimônio, a vida, a liberdade, a integridade física e a tranquilidade pessoal. Embora com considerável atraso, entrou em vigor no dia 17/4/09, a lei 11.923/09 (clique aqui), que introduziu o tipo penal genuinamente brasileiro denominado sequestro relâmpago, no artigo 158 § 3º do Código Penal (clique aqui). A conduta do infrator oscilava penalmente. Algumas vezes era considerada roubo qualificado ou agravado, outras extorsão mediante sequestro. Agora, com a nova lei, o habitat do tipo penal passa a ser uma modalidade de extorsão. Na extorsão o autor, mediante violência ou grave ameaça, necessita da colaboração efetiva da vítima, que, privada de seu direito de deambulação, fica à disposição dele durante o tempo necessário para que o locupletamento se concretize. O exemplo mais constante fala por si só: o agente constrange a vítima a acompanhá-lo a diversos caixas eletrônicos para sacar dinheiro através de cartões magnéticos fornecidos por ela, assim como as senhas. No roubo, é diferente. A vítima fica tolhida, sem exprimir sua vontade, numa situação de total impotência diante da ameaça, obrigando-a a entregar seus bens. O constrangimento que fala a lei não é aquele que circula pelo direito civil que possibilita a anulação de um ato em razão do vício da manifestação de vontade. Vai muito além. No campo penal é a seriedade que o extorsionário imprime à sua conduta no sentido de obter de forma dolosa vantagem econômica ilícita, depois de reduzir a liberdade de locomoção da vítima, que fica à sua mercê. Mas o novo tipo penal, apesar de nascer festejado, carrega a sensação de impunidade diminuída, como sói acontecer nas últimas leis penais. Um país afetado pelo alto índice de criminalidade, não se pode dar ao luxo de despenalizar e descriminalizar condutas e beneficiar o infrator com penas mais brandas. Antes da lei nova, a pena pelo crime de extorsão mediante sequestro, era de oito a quinze anos de reclusão. Agora, de seis a doze anos. Pena diminuída e que favorece o réu, devendo ser aplicada imediatamente. Não só. Antes o crime enquadrava-se no rol dos hediondos. Agora, trata-se de crime comum, susceptível de graça, anistia e indulto, além de exigir unicamente o cumprimento de um sexto da pena para a progressão de regime. O caráter de hediondez somente revestirá a conduta se em razão da agressão ocorrer o evento morte. A nova lei, apesar de ter assento penal definitivo, não emprestou o rigorismo que a sociedade tanto clama para crimes cometidos com tamanho desdém, quebrando todas as regras protetivas da dignidade humana. A ideia de direitos humanos, cristalizada na Declaração Universal adotada pela ONU, vem sendo sangrada constantemente pela violência praticada ou permitida pelo próprio Estado. Assim vamos assistindo o misterioso e inexplicável sacrifício da vida humana. E pior. Vamos nos acostumando a esta tragédia bufa. A título de curiosidade, a pena do sequestro relâmpago na modalidade comum é a mesma do homicídio simples. Então chegamos ao fundo do poço. Há algo de errado nos princípios apregoados pela Constituição Federal, quando elege a vida como a prioridade. A vida humana vale tanto quanto um saque em caixa eletrônico. Como diz a moçada: Tá ligado? Sacou?... Fonte: Migalhas
*Advogado, Promotor de Justiça aposentado e Reitor da Unorp
*Advogado, Promotor de Justiça aposentado e Reitor da Unorp
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