sexta-feira, 30 de abril de 2010

Advocacia agredida


por Antonio Cláudio Mariz de Oliveira*

Há poucos dias, assistimos estarrecidos à violência cometida contra o advogado Roberto Podval, defensor do casal Nardoni. Com destemor, competência e altivez ele exerceu o sagrado direito de defesa, em nome de acusados que já estavam condenados pela mídia e pela opinião pública. Foi alvo de agressão física e de inúmeras outras de natureza moral, que não o alcançaram por ser ele portador de inatingível dignidade pessoal.

A incompreensão histórica que nos acompanha, e que agora recrudesceu, faz com que os advogados sejam vistos como cúmplices do cliente.

Consideram-nos advogados do crime, e não porta-vozes dos direitos constitucionais e processuais do acusado, que, diga-se, são direitos e garantias de todos e de cada qual. Portanto, violados quaisquer deles num caso concreto, mesmo se tratando de acusado notoriamente culpado, a próxima violação poderá atingir qualquer cidadão, ainda que inocente. Vale repetir à exaustão: nós, advogados, não somos defensores do crime, defendemos a obediência aos direitos e às garantias individuais.

Na atualidade o desprestígio da advocacia atingiu níveis inimagináveis. Pode-se afirmar a ocorrência de algo inédito em nosso país: a advocacia está sendo hostilizada.

Um Estado repressor e policialesco em franca formação, de um lado, e, de outro, uma mídia sedenta de escândalo e tragédia, especializada na teatralização do crime, têm contribuído para a construção de uma imagem negativa da advocacia e, o que é mais grave, têm contribuído para apequenar o próprio direito de defesa. Passou ele a ser considerado como desnecessário, inconveniente, instrumento de chicanas e de ganho para os advogados.

É estranho que a advocacia esteja sendo criticada em aspectos absolutamente comuns a outras profissões, que, no entanto, ficam impunes.

Fala-se que os pobres não podem contratar bons advogados por não poderem pagar os honorários, ficando carentes de assistência jurídica. Admitindo-se como correta a afirmação, também é correto dizer que os pobres são carentes de boa saúde, de adequada educação e de habitação digna. A culpa não é dos advogados, dos médicos ou dos engenheiros, mas sim da trágica desigualdade social que reina no País. Note-se que, no caso da advocacia, os carentes de recursos são assistidos ou pelos não poucos advogados que lhes atendem gratuitamente, ou pelos que, conveniados pelo Estado, lhes prestam assistência e recebem irrisórios honorários do Estado, ou ainda pelos competentes e dedicados defensores públicos.

Verbera-se, ainda, que advogados cobram honorários elevados. Trata-se de uma assertiva que, se verdadeira, não pode ser generalizada, pois a maioria esmagadora dos profissionais (200 mil só em São Paulo) enfrenta grandes dificuldades no mercado de trabalho. De qualquer forma, ela causa espécie. A contratação de honorários é ato bilateral - há quem cobre e há quem aceite e pague. Qual o motivo de estranheza ou de crítica? Para uma sociedade que supervaloriza o ganhar e o ter, em detrimento do ser, tal observação é ridícula, para não dizer hipócrita. Podem ganhar os jogadores de futebol, os artistas, os grandes médicos, cirurgiões plásticos, os arquitetos e decoradores, os empresários, os banqueiros, os jornalistas e apresentadores de TV, etc., etc. No entanto, dos advogados se parece querer exigir trabalho não remunerado.

Antes mesmo de o Estado se organizar tal como o conhecemos hoje havia aqueles que "eram chamados" para emprestar a sua voz - os chamados "boqueiros" - em prol dos que careciam de defesa. É verdade o que se diz: o primeiro advogado foi o primeiro homem que com a sua palavra defendeu um semelhante contra uma injustiça. Sempre fomos e seremos os "boqueiros" daqueles que não têm voz e não têm vez.

Qualquer cidadão, inocente ou culpado, ou titular de uma pretensão, procedente ou improcedente, tem o direito de recorrer ao Poder Judiciário para se defender e para deduzir a sua postulação. E nós, advogados, somos os agentes do exercício desses direitos perante quaisquer juízos e tribunais, pois exercemos com exclusividade a chamada capacidade postulatória. Somente nós, advogados, temos o poder de movimentar o Judiciário, que é originariamente inerte. No juízo criminal exercemos o direito de defesa, sem o qual o processo nem sequer pode ser instaurado. Somos, pois, o elo entre o povo e a Justiça.

A propósito da defesa no processo penal, mesmo os mais furiosos adeptos de punição contra os acusados deveriam respeitar e defender o direito de defesa, pois sem ele os seus instintos sanguinários nunca poderiam ser satisfeitos, a não ser pela vingança privada.

Nos momentos de ruptura institucional ou de obscurantismo social, os advogados sempre foram desrespeitados e agredidos. Napoleão Bonaparte desejou cortar a língua dos advogados. Durante a Revolução Francesa, Robespierre e o promotor Fouquier-Tinville impediram a atuação dos advogados na defesa dos acusados. Em menos de uma semana houve mais de mil condenações e decapitações. E, durante a Revolução, Malesherbes e Nicolas Barrier foram guilhotinados por exercerem a defesa.

A história recente do Brasil registra a heroica epopeia dos advogados que se opuseram com rara coragem e desprendimento às ditaduras getulista e militar.

Não estamos vivendo hoje um período de ruptura institucional, mas atravessamos triste período de verdadeiro obscurantismo, representado por uma cultura repressiva que se instalou no seio da sociedade e que reflete a intolerância raivosa, a insensatez, o ódio e o desejo de expiação e de vingança. Tais sentimentos não raras vezes atingem a advocacia.

Embora o caminhar seja árduo, e sempre o foi, continuaremos a seguir a nossa saga. Continuaremos a exercer o nosso glorioso ministério de postular pelo direito e pelo justo em nome de terceiros, em benefício da cidadania e da democracia.

* Antonio Cláudio Mariz de Oliveira é advogado do escritório Advocacia Mariz de Oliveira

Fonte: O Estado de S. Paulo de ontem, 29/4/2010.
Ilustração: Migalhas

Abandono moral como ilícito civil e penal


A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - CCJ aprovou o parecer do PLS - PROJETO DE LEI DO SENADO, Nº 700 de 2007 que modifica a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) para caracterizar o abandono moral como ilícito civil e penal, e dá outras providências.

A proposição legislativa em tela objetiva caracterizar o que denominou abandono moral como ilícito civil e criminal. Para tanto conceituou a assistência moral devida aos filhos menores de dezoito anos como aquela que se dá pelo “convívio ou visitação periódica, que permita o acompanhamento da formação psicológica, moral e social da pessoa em desenvolvimento” e, em especial, “a orientação quanto às principais escolhas e oportunidades profissionais, educacionais e culturais; a solidariedade e apoio nos momentos de intenso sofrimento ou dificuldade; e a presença física espontaneamente solicitada pela criança ou adolescente e possível de ser atendida.”

O
PLS Nº 700 foi encaminhado à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa- CDH(SF) para ser apreciado em decisão terminativa.

Leia a íntegra do parecer (
clique aqui).

Fonte: Senado Federal

Conflito de competência em violência doméstica


CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 110.609 - RJ (2010/0029106-2)

RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
SUSCITANTE: PRIMEIRA TURMA RECURSAL CRIMINAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
SUSCITADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INTERES.: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INTERES.: JAIME DELFINO DA SILVA


EMENTA

PROCESSO PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PRÉVIO CONFLITO ENTRE JECRIM E JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

1. Compete ao Tribunal de Justiça, e não à Turma Recursal, dirimir conflito de competência entre juizado especial criminal e juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher.

2. Conflito conhecido para declarar competente o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, o suscitado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado, Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Felix Fischer.

Ausente, ocasionalmente, a Sra. Ministra Laurita Vaz.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima.

Brasília, 14 de abril de 2010(Data do Julgamento)

Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora

RELATÓRIO

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):

Cuida-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo PRIMEIRA TURMA RECURSAL CRIMINAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no seio da ação penal deflagrada para apurar a conduta prevista no art. 129, § 9.º, do Código Penal, atribuída a Jaime Delfino da Silva que teria incorrido em violência doméstica contra Rosangela Queiroz da Silva.

Em manifestação de fl. 55, o VIII JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO declinou da competência, em razão do art. 3.º do Provimento 50/2008, que determinou a redistribuição das contravenções penais existentes no I Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca da Capital para os Juizados Especiais Criminais.

Neste último juízo, suscitou-se conflito de competência ao Tribunal de Justiça, o qual proferiu decisão, da qual se extrai o seguinte:

Ocorre que, mesmo que a contravenção tenha sido cometida no âmbito de violência doméstica, não deixa de ser de menor potencial ofensivo, forçando frisar que o artigo 41 da Lei 11.340/06 apenas afasta a incidência da referida Lei 9.099/95, aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, no que se refere aos institutos despenalizadores da referida lei, como por exemplo a transação penal, o sursis processual, a substituição da pena por restritiva de direitos, etc. (fl. 75).

Lá aportando os autos, o Ministério Público apresentou exceção de incompetência, da qual se realça o seguinte:

A Turma Recursal não é competente para apreciar nenhum caso que envolva violência doméstica, independentemente da pena cominada à infração. De igual forma, não é competente para dirimir conflito de competência que envolva violência doméstica.

Destaco a recente decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, de 11.11.2009, no processo 2009.700.566159, afirmando a competência do Tribunal de Justiça para o julgamento dos casos de violência doméstica. (fl. 10).

Com fulcro em tais argumentos, a I Turma Recursal Criminal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, suscitou o conflito de competência, fl. 12.

O Ministério Público Federal apresentou parecer, fls. 21-25, da lavra do Subprocurador-Geral da República Maurício Vieira Bracks, opinando pelo afastamento da competência da Turma Recursal.

É o relatório.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 110.609 - RJ (2010/0029106-2)

EMENTA

PROCESSO PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PRÉVIO CONFLITO ENTRE JECRIM E JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

1. Compete ao Tribunal de Justiça, e não à Turma Recursal, dirimir conflito de competência entre juizado especial criminal e juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher.

2. Conflito conhecido para declarar competente o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, o suscitado.

VOTO

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):

Como se trata de conflito de competência entre Turma Recursal a Tribunal de Justiça, nos moldes do art. 105, I, d, da Constituição Federal, é o caso de se conhecer do presente feito.

Por meio deste feito, busca-se determinar a quem cabe julgar o conflito de competência entre juizado especial criminal e juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher.

É importante ter presente que o juizado de violência doméstica não se insere na estrutura dos juizados especiais, cujos recursos são encaminhados para a apreciação das Turmas Recursais, como bem se depreende da disciplina trazida pela Lei 11.340/05:

Art. 13. Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei.

Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária.

Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado:
I - do seu domicílio ou de sua residência;
II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;
III - do domicílio do agressor.

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.

Lembre-se, ainda, a seguinte lição de MARIA BERENICE DIAS:

A Lei Maria da Penha - lei da mesma hierarquia - afastou a violência doméstica da égide da Lei 9.099/1995. Assim, se a vítima é mulher e o crime aconteceu no ambiente doméstico, não pode ser considerado de pouca lesividade e não mais será apreciado pelos JECrim. (A lei Maria da Penha na justiça. Ed. RT: 2007, p. 62).

Cuidando também de conflito envolvendo o TJRJ e Turma Recursal, a Terceira Seção entendeu que seria competente o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro: CC 108.939/RJ, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/03/2010, p. 24/03/2010; CC 109.341/RJ, Rel. Min. Nilson Naves, j. 09/03/2010, p. 16/03/2010; CC 109.067/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11/02/2010, p. 19/02/2010.

Desta forma, o mais apropriado, penso, é a fixação da competência do Tribunal de Justiça fluminense para dirimir o conflito entre os dois juizados em foco, dado que se trata de dois juízos submetidos à sua autoridade.

Outro não é o entendimento estabelecido pelo Pretório Excelso (Informativo n.º 557, de 24 a 28 de agosto de 2009):

"Compete ao Tribunal Regional Federal o julgamento de conflito de competência estabelecido entre Juizado Especial Federal e juiz de primeiro grau da Justiça Federal da mesma Seção Judiciária. Com base nesse entendimento, o Tribunal proveu recurso extraordinário, para anular acórdão do Superior Tribunal de Justiça, determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a fim de que julgue, como entender de direito, o conflito de competência entre o Juízo Federal do 7º Juizado Especial e o Juízo Federal da 35ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro. Na espécie, o STJ, dando solução ao aludido conflito, declarara o Juízo Federal competente para julgar ação declaratória de nulidade, cumulada com pedido de pensão por falecimento, ajuizada contra o INSS. Contra essa decisão, o Ministério Público interpusera agravo regimental, ao qual fora negado provimento, o que ensejara a interposição do recurso extraordinário. Salientou-se, inicialmente, que, nos termos do art. 105, I, d, da CF, a competência do STJ para julgar conflitos de competência está circunscrita aos litígios que envolvam tribunais distintos ou juízes vinculados a tribunais diversos. Considerou-se que a competência para dirimir o conflito em questão seria do Tribunal Regional Federal ao qual o juiz suscitante e o juizado suscitado estariam ligados, haja vista que tanto os juízes de primeiro grau quanto os que integram os Juizados Especiais Federais estão vinculados àquela Corte. No ponto, registrou-se que esse liame de ambos com o tribunal local restaria caracterizado porque: 1) os crimes comuns e de responsabilidade dos juízes de primeiro grau e das Turmas Recursais dos Juizados Especiais são julgados pelo respectivo Tribunal Regional Federal e 2) as Varas Federais e as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais são instituídos pelos respectivos Tribunais Regionais Federais, estando subordinados a eles administrativamente. Reportou-se à orientação firmada pelo Tribunal no julgamento do HC 86834/SP (DJU de 9.3.2007), no sentido de reconhecer a competência do Tribunal Regional Federal para o julgamento dos crimes comuns e de responsabilidade praticados por juízes de primeiro grau e das Turmas Recursais. Citou-se, também, o disposto na Lei 10.259/2001, que comete aos Tribunais Regionais Federais a faculdade de instituir os Juizados Especiais Federais e de estabelecer sua competência, bem como lhes atribui o poder-dever de coordenar e prestar suporte administrativo aos Juizados Especiais (artigos 21, 22 e 26). Observou-se, ademais, que a Constituição não arrola as Turmas Recursais dentre os órgãos do Poder Judiciário, os quais são por ela discriminados no art. 92, de forma taxativa, outorgando-lhes, apenas, a incumbência de julgar os recursos oriundos dos Juizados Especiais. Considerou-se que a Constituição não conferiu, portanto, às Turmas Recursais, integradas por juízes de primeiro grau, a natureza de órgãos autárquicos ou a qualidade de tribunais, também não lhes tendo outorgado qualquer autonomia com relação aos Tribunais Regionais Federais. Explicou-se que, por isso, contra suas decisões não cabe recurso especial ao STJ, mas sim recurso extraordinário ao Supremo. Assim, não sendo possível qualificar as Turmas Recursais como tribunais, não seria lícito concluir que os juízes dos Juizados Especiais estariam a elas vinculados, salvo - e exclusivamente - no que concerne ao reexame de seus julgados. Outro precedente citado: RE 136154/DF (DJU de 23.4.93)."

Ante o exposto conheço do conflito para declarar competente o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, o suscitado, para dirimir o conflito de competência entre o VIII JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO e a I TURMA RECURSAL CRIMINAL DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO.

É como voto.

Documento: 961786 Parcial Teor do Acórdão - DJ: 28/04/2010

Fonte: STJ

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Universal enviou R$ 400 milhões ao exterior entre 1995 e 2001, diz jornal

Segundo 'O Estado de S. Paulo', dona de casa de câmbio fez a revelação.
Defesa da Universal negou as acusações.

Reportagem publicada nesta quarta-feira (28) pelo jornal "O Estado de São Paulo" diz que a Igreja Universal do Reino de Deus remeteu ao exterior, de forma supostamente ilegal por meio de doleiros, cerca de R$ 5 milhões por mês entre os anos de 1995 e 2001. Com isso, o valor enviado seria próximo de R$ 400 milhões.

O jornal diz que a informação foi dada por Cristina Marini, sócia da casa de câmbio Diskline, empresa por meio da qual o dinheiro teria sido remetido. Ela prestou depoimento na terça-feira (27) a promotores do Ministério Público Estadual de São Paulo e, conforme o "Estado", repetiu o depoimento já havia sido dado à Promotoria da cidade de Nova York.

A defesa da Universal negou as acusações, segundo a reportagem.

O depoimento da empresária faz parte do processo que tramita desde agosto do ano passado na Justiça de São Paulo contra dez líderes da igreja, acusados pelo Ministério Público de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

A denúncia do MP dizia que a Universal desviou dinheiro doado por fiéis para o exterior e usou os valores para compra de empresas de comunicação no Brasil. Para os promotores, os líderes da igreja se aproveitaram da imunidade tributária da Universal, já que a Constituição prevê que "templos de qualquer culto" sejam isentos de impostos.

De acordo com "O Estado de S.Paulo", Cristina Marini e seu sócio Marcelo Birmarcker colaboram com as investigações sobre a Universal no Brasil e nos Estados Unidos em troca de benefícios em caso de condenação. Os dois passaram a ser investigados nos Estados Unidos após as autoridades brasileiras pedirem cooperação internacional para apurar o caso.

Cristina afirmou, segundo o "Estado", que começou a enviar dinheiro da Universal para o exterior em 1991. As operações teriam se intensificado entre 1995 e 2001 e era utilizado o sistema "dólar-cabo", no qual o dono do dinheiro entrega ao doleiro o valor em espécie em reais e o mesmo deposita em dólares em uma conta do cliente no exterior. A empresária disse que recebia pessoalmente o dinheiro e que o contato era feito com Alba Maria da Silva Costa, da cúpula da Igreja e uma das rés do processo na Justiça paulista.

Ao "Estado", o advogado Antônio Pitombo, que defende a Universal, afirmou que já esperava "um fato novo" no processo. "Todas as vezes que são impetradas medidas judiciais contra a ilegalidade na investigação são criados fatos e manchetes para perturbar a neutralidade do julgamento."

Entenda o caso

De acordo com o MP, os líderes da Igreja Universal integram um grupo que supostamente remetia os recursos oriundos de doações dos fiéis da igreja para duas empresas: a Unimetro Empreendimentos S/A e a Cremo Empreendimentos S/A. Segundo os promotores, seriam empresas de fachada.

Segundo comunicado divulgado pelo Ministério Público na ocasião, "para os promotores, ficou comprovado que o dinheiro das doações, em vez de ser utilizado para a manutenção dos cultos, era desviado para atender a interesses particulares dos denunciados".

A promotoria diz que Cremo e a Unimetro "remetiam esses recursos para empresas localizadas em paraísos fiscais". Segundo o MP, "o esquema garantia que o dinheiro retornasse ao Brasil em forma de contratos de mútuo celebrados com intermediários que fazem parte do grupo acusado, e fosse utilizado na compra de empresas de comunicação".

Em 2004 e 2005, de acordo com o MP, as duas empresas "foram responsáveis pela movimentação, ocultação e dissimulação de mais de R$ 71 milhões". O Ministério Público afirma que, há dez anos, o grupo utiliza a Igreja Universal para a prática de fraudes.

Fonte: G1

Matemática justa: quando menos é mais


por Oscar Villhena Vieira*

É muito oportuno que a Transparência Brasil volte sua atenção ao Judiciário brasileiro e, em especial, ao STF, dada à proeminência política assumida por esta corte nos últimos anos. Parece não haver tema relevante de nossa vida política, econômica ou mesmo moral que mais dia ou menos dia não cobre do supremo uma última palavra. E, numa República, no dizer do ministro Celso de Mello, não pode haver "círculos de imunidade do poder".

A escolha da questão da produtividade dos ministros, no entanto, não me parece o tema mais relevante e sequer acertado, se o objetivo é aumentar o controle social sobre o STF, até porque o problema do supremo brasileiro é que os ministros decidem muito, não pouco. Não há tribunal constitucional no mundo que tome mais decisões que o brasileiro. Em recente seminário na África do Sul, ao apresentar números do supremo, percebi um ar de ceticismo na audiência. Não demorou muito para que o juiz Jacoob, proeminente membro da Corte Constitucional sul-africana, gentilmente me interrompesse: "caro Oscar os seus números são inverossímeis; 115 mil casos ao ano, significa que, se a corte trabalhasse 240 dias por ano, estaria decidindo 479 casos por dia, o que é mais do que nossa corte julgou em toda sua existência. Isso não me parece possível". Expliquei então que mais de 90% das decisões do tribunal eram tomadas monocraticamente e segui minha apresentação. Logo o juiz Jacoob me interrompeu com sua indefectível matemática: "dividindo o total de casos por 11 juízes, isto daria mais de 10 mil casos por ano, por juiz, o que significa cerca de 1 caso a cada 12 minutos. Impossível!" A mesma estranheza poderia ser manifestada por qualquer membro da suprema corte norte-americana, alemã, canadense, portuguesa ou colombiana. Definitivamente o problema de nosso supremo e de seus ministros não é trabalhar pouco.

Como salientou o ministro Joaquim Barbosa a "Constituição de 1988 atribui ao Supremo esse número absolutamente irracional de competências" (OESP, 3 abril, A 10). Ao STF foram atribuídas funções que na maioria das democracias estão divididas em pelo menos 3 tipos de instituições: cortes constitucionais, tribunais recursais de última instância e foros judiciais especializados. Desta forma, um mesmo órgão, formado por apenas 11 pessoas, julga todas as ações voltadas a controlar a constitucionalidade de leis e atos emanados das esferas estaduais e federal; recebe milhares de recursos extraordinários e agravos de instrumentos voltados a rever decisões de tribunais inferiores; além de julgar ações que envolvam altas autoridades; isto sem falar nos famosos habeas corpus ou pedidos de extradição, que todos os dias abarrotam a pauta do supremo. O problema, portanto, é como reduzir o trabalho dos ministros, para que possam devidamente empregar a enorme autoridade que lhes foi atribuída pela Constituição na solução de controvérsias efetivamente relevantes.

O experiente ministro Cezar Peluso, que assumirá a presidência do STF ainda este mês, terá, assim, enormes desafios. O primeiro deles é baixar o número obsceno de processos que chegam ao tribunal todos os anos. Embora a emenda 45 tenha criado mecanismos voltados a reduzir o impacto deste defeito estrutural da Constituição, há muito ainda a ser feito, tanto pelo Congresso Nacional, como pelo próprio tribunal. Ao congresso cumpre, em diálogo com o supremo, transferir para outras esferas judiciais inúmeras competências. Ao supremo, por sua vez, cabe aprofundar a política de argüição de repercussão geral, transferindo às instâncias judiciais inferiores a responsabilidade de por termo a dissídios que, mantidas na fila do STF, apenas retardam a prestação de justiça aos cidadãos.

Reduzidos os processos, um segundo desafio será reformular o modo pelo qual se constrói a agenda do tribunal. Hoje é difícil compreender a lógica. Alguns processos são julgados em 24 horas e outros permanecem sem decisão por anos. Como justificar isso? Esta, sim, seria uma questão sobre a qual a Transparência Brasil poderia se debruçar, com mais proveito. Por que o pedido de intervenção federal em Rondônia, em função de graves violações de direitos humanos, jamais foi apreciado, enquanto alguns Habeas Corpus são concedidos instantaneamente? É urgente que o STF seja capaz de estabelecer uma agenda mais transparente e criteriosa dos casos que serão apreciados ao longo do semestre ou do ano judiciário. Ele não pode ser tratado como um tribunal de pequenas causas, obrigado a responder imediatamente a tudo que lá chega.

Reduzido o número de casos e estabelecida uma agenda que permita à sociedade saber antecipadamente o que constará da pauta do tribunal, seria possível qualificar o seu processo de deliberação. Em primeiro lugar deveria reduzir ao máximo, senão eliminar, a possibilidade de decisões monocráticas. Um tribunal é, por definição, colegiado. Daí deriva grande parte de sua autoridade, que o excesso de decisões monocráticas coloca em risco.

Decidir coletivamente, no entanto, não pode se resumir a contar votos. O pressuposto básico de um Tribunal que profere a última palavra sobre questões de tamanha relevância é que suas decisões sejam fruto de um robusto processo de deliberação entre os ministros, que aspire refletir uma espécie de "razão pública", na linguagem de Rawls. O que temos hoje, devido à premência do tempo, é uma leitura seqüencial de votos, que eventualmente gera discussões, mas que não resultam na adoção de uma posição da corte, como um ente coletivo.

Não podemos permitir a erosão da autoridade do Supremo. Em política, muitas vezes, menos pode significar mais.

*Diretor jurídico da Conectas Direitos Humanos. Professor de Direito Constitucional e coordenador do Programa de Mestrado em Direito e Desenvolvimento da Direito GV

Fonte: Migalhas

quarta-feira, 28 de abril de 2010

José Alencar é vítima de extorsão através do 'golpe do sequestro'


Quem não sofreu um destes golpes, ou não tem um amigo ou familiar próximo que não tenha sofrido? Ou a informação de um acidente, que é uma das muitas derivações do golpe. Então o bom é prevenir, e não municiar os bandidos, sem o que não há festa. Todo o cuidado é pouco. E nunca é demais divulgar. Edu Buys

O vice-presidente da República, José Alencar, foi vítima, na noite de domingo, em seu apartamento no Rio, do golpe do falso sequestro. Sem empregados em casa, em Ipanema, ele mesmo atendeu ao toque do telefone, aceitando a chamada a cobrar e ouvindo, do outro lado da linha, o choro forte de uma jovem, que ele julgou fosse uma de suas filhas. Ela apelava, desesperada: “Meu pai, meu pai, me pegaram, meu pai, estou amarrada, paga logo eles para eles me soltarem, meu pai!”. Ato contínuo, um suposto sequestrador assumiu o telefone, anunciando que a moça estava em seu poder e exigindo R$ 50 mil de resgate.

Muito tenso, Alencar tentou argumentar, alegando não ter, àquela hora, tal soma. “Não sou do Rio, não tenho tudo isso aqui!”. O criminoso, irredutível, também pediu joias. Alencar explicou que sua mulher, muito religiosa, fizera promessa e não as tinha. Depois de negociar sob pressão emocional, ouvindo o choro da “filha” ao fundo, Alencar conseguiu baixar para R$ 20 mil e, em seguida, sem desligar, acionou o empresário Walter Moraes: “Preciso pegar R$ 20 mil com urgência no Banco do Brasil”. O amigo se prontificou, ouvindo: “Então manda providenciar para mim, é uma emergência, é uma emergência”.

Enquanto aguardava pelo dinheiro, ainda ao telefone, o interlocutor fez a pergunta: “Você trabalha com o quê?”. E ele: “Eu sou vice-presidente da República do Brasil”. E o bandido: “Qual é seu nome?”. “José Alencar Gomes da Silva”. Ato contínuo, o bandido desligou. A segurança da Vice-Presidência apura a origem do telefonema, que, tudo leva a crer, foi mais um a partir de presídios, que, por mais que a população sofra, continuam a receber sinal das empresas de telefonia móvel, mais afeitas ao seu lucro do que às necessidades da população.

Nem o vice-presidente escapa!

Thiago Feres:
A tentativa de extorsão pelo telefone sofrida pelo vice-presidente da República José Alencar, enquanto estava em sua residência, no bairro de Ipanema (Zona Sul), no último domingo, serve para reforçar o alerta aos moradores da cidade sobre os riscos do golpe aplicado por bandidos. Alencar relatou à colunista do JB Hildelgard Angel que, depois de ouvir uma voz feminina clamando por socorro e ser informado pelos criminosos de que se tratava da sua filha, não desligou o telefone e negociou. Nervoso, conseguiu reduzir o valor de R$ 50 mil – pedido pelos golpistas – para R$ 20 mil. A conversa só não avançou porque os bandidos desligaram após serem informados de que estavam falando com o vice-presidente da República.

Com experiência na investigação desse tipo de crime, o titular da Divisão Anti-Sequestro da Polícia Civil, Marcos Reimão, fez críticas ao atual modelo adotado pelas operadoras de telefonia móvel do país. Segundo ele, a preocupação com o lucro permite que clientes estejam cadastrados nos bancos de dados das empresas sem informações básicas que poderiam solucionar casos de extorsão por telefone.

– O interesse público nunca foi prioridade para as operadoras, já que a parte financeira está acima de tudo e de todos – reclama Reimão. – Em casos policiais, as vítimas estão em risco iminente. Por isso, não podemos aguardar os longos períodos que as empresas nos pedem para levantar alguns dados. Além da demora do Judiciário, ainda precisamos esperar as operadoras.

Outras vítimas

De acordo com o delegado, pelo menos mais dois casos semelhantes ao vivido por José Alencar ocorreram no Rio no último fim de semana. Segundo ele, a pouca divulgação dessa prática criminosa pode estar favorecendo os bandidos. Para evitar prejuízos financeiros e desgaste emocional, o delegado recomenda que a população desligue o telefonema ao ser informado pelos golpistas

Sei que é difícil, mas a população não deve dar conversa. Desliga o telefone e procura fazer contato com a possível vítima. Caso ela não seja localizada, a polícia é que deve ser procurada – orienta.

Segundo a polícia, normalmente, as ligações dos bandidos partem de dentro dos presídios. No entanto, até o fechamento desta edição, a Secretaria de Administração Penitenciária não havia informado quais unidades do estado utilizam bloqueadores de chamadas, se limitando a dizer que o Complexo Penitenciário de Bangu conta com o sistema. Apesar disso, a pasta não informou se o software utilizado é passível de falhas.

Já as estatísticas do Instituto de Segurança Pública (ISP) não são capazes de precisar se a ação vem aumentando ou sofrendo redução, uma vez que esse tipo de crime é registrado como estelionato, que engloba outras práticas. No último mês de fevereiro, foram 3.344 registros em todo o estado. No mesmo mês do ano passado, o número foi um pouco maior: 3.396.

A Secretaria de Segurança informou que possui uma série de mecanismos gerenciados pela Polícia Civil para combater a extorsão por telefone. Uma delas é a utilização de um software chamado de “guardião”, que consegue rastrear – sempre com autorização judicial – ligações dos suspeitos.

Presídios de segurança máxima são imunes

As prisões de segurança máxima do governo federal, como a de Catanduvas, no interior do Paraná, ou a de Campo Grande (MS), já foram construídas com antenas e equipamentos eletrônicos internos que não permitem o uso de celular num raio de aproximadamente 100 metros ao redor das cadeias.

Não há números porque os registros de ocorrências são irrisórios. As vítimas ficam com vergonha porque, na verdade, trata-se de um estelionato prosaico, que só da certo porque a vítima entra em pânico. Todos os dias centenas de desavisados, especialmente nos grandes centros, caem no golpe. Simulando o papel de bombeiro ou de policial, voz firme como se estivesse atendendo uma ocorrência de acidente, o criminoso telefona a cobrar para um número de telefone fixo qualquer e pergunta ao interlocutor:

“O senhor (a) tem alguém fora de casa?”. Se a resposta for positiva e já vier com o nome de quem está fora naquele horário, começa a grande encenação. Normalmente a pessoa se desespera por imaginar uma tragédia, e então o criminoso encontra o espaço que estava esperando.

Em seguida, avisa que a pessoa está seqüestrada e solta uma gravação, cuja voz deve ser semelhante ao perfil do “sequestrado”, em geral o filho ou a filha de quem atendeu. Os gritos apavoram. O criminoso passa então a fazer as exigências: a vítima não deve telefonar para ninguém a partir daquele momento e recebe o número de uma conta bancária para transferir imediatamente determinada quantia. Consumado o golpe, quando a polícia vai atrás do dinheiro, a conta do falsário que está fora dos presídios já foi desativada. O valor varia de acordo com o padrão econômico da vítima, mas normalmente o prejuízo fica em torno de R$ 5 mil. Fora o susto.

Fonte: JB Online

AGU quer o fim da contratação de advogados particulares para defender tribunais do país

Mas assim assume o papel de acusação e de defesa em um mesmo processo

Nos corredores jurídicos, a Advocacia-Geral da União (AGU) e tribunais de todo o país travam uma guerra de bastidores. A batalha se dá em torno da contratação de advogados particulares pelas cortes. No fim do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que advogados privados não têm legitimidade para representar a União. A vitória da AGU representa um novo desafio para a entidade, que tem como missão defender todos os órgãos que compõem os Três Poderes da União: o de atuar nas duas pontas de um mesmo processo nos casos em que há disputa entre dois órgãos do Estado.

O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, encontrou uma solução alternativa para dar defesa jurídica adequada aos órgãos. Instituiu a figura do “advogado ad hoc”, profissional concursado da AGU designado para “um fim específico” de representar a parte no processo. “Essa é uma solução que atende o interesse do órgão e o interesse público. A instituição compõe os dois lados, dando tratamento equânime”, afirmou a secretária-geral de Contencioso da AGU, Grace Mendonça.

De acordo com a secretária, as batalhas jurídicas ocorrem somente depois de esgotadas as possibilidades de conciliação. “Quando não é possível, é assegurada a defesa das duas partes nas disputas judiciais. Não há ingerência ou interferência do Poder Executivo na atuação da AGU”, destacou Grace. O presidente da Associação Nacional dos Advogados da União, André Gustavo Alcântara, considera positivo o uso do “advogado ad hoc”. Segundo ele, é um profissional com liberdade para atuar da forma como achar mais eficiente para o órgão que defende.

Os embates processuais em que advogados da União representam as duas partes já são numerosos. Um exemplo é a disputa entre o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determinou, no começo do ano, a imediata exoneração de servidores concursados ocupantes de cargos em comissão no tribunal que tenham parentesco com magistrados. O CNJ apontou que esse é o caso de cinco filhos de desembargadores.

O TJDFT não cumpriu a decisão do CNJ. Contratou um famoso escritório de advocacia de Brasília para representá-lo em um recurso protocolado no STF. O caso ainda não tem data para ser julgado de forma definitiva. Por enquanto, uma liminar permite que os parentes dos magistrados do TJDFT permaneçam nas funções que ocupam.

No entanto, além de acionar a Justiça para alegar que o caso não configura nepotismo, o tribunal se envolveu em uma batalha de bastidores com a AGU, que contestou a atuação do advogado particular em defesa do TJDFT e nomeou um “ad hoc” para representar a Corte. No Supremo, prevaleceu a peça feita pelo advogado público. A assessoria do tribunal disse que o escritório de advocacia foi contratado para que fossem respeitados os prazos processuais. Informou ainda que considera positiva a atuação da AGU na defesa do órgão.

Precedente
O precedente para o veto à contratação de advogados foi aberto em outubro do ano passado, quando o STF considerou ilegítima a atuação de um advogado contratado para defender o Tribunal Regional Federal da 3ª Região. “Com a estrutura que a AGU possui, não se justifica mais que órgãos paguem escritórios sem compromisso com o que é público para assumirem o papel que é de um defensor público”, afirmou André Gustavo Alcântara. “(A contratação de advogados particulares) significa um custo dobrado para os cofres públicos”, completou Grace.

Ao defender a prerrogativa da AGU, a secretária avaliou que a presença de advogados da União nos dois lados do processo é uma solução confortável, que não causa qualquer saia justa ao órgão. “Há um tratamento igualitário”, disse. De acordo com o advogado-geral da União, em alguns casos a AGU assume uma posição em prol de uma parte, mas jamais deixa de fornecer defesa adequada para o outro lado. “O fato de atuarmos nos dois lados não evita o conflito, mas ajuda na atuação”, disse Adams.

Estrutura
Duas décadas depois de ter sido criada, somente agora a AGU está estruturada para exercer suas funções. A entidade é composta por 8 mil advogados públicos, de quatro carreiras. Os advogados da União, que defendem os órgãos públicos; os procuradores federais, que atuam na administração indireta, como autarquias; os procuradores da Fazenda Nacional, responsáveis pela área tributária; e os procuradores do Banco Central, especializados na área financeira.

Fonte: Correio Brasiliense

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Pesquisador diz que os estudantes de Direito precisam aprender a ler como advogados


A maioria dos estudantes o direito é dito que eles precisam pensar como advogados. Mas um pesquisador da Universidade Estadual da Pensilvânia diz que os estudantes também precisam ler como advogados. O cientista e professor do ensino superior, Dorothy Evensen estudadas estratégias de estudantes de Direito "a leitura. Ela constatou que os alunos melhor lei gastou mais de seu tempo de leitura através de estratégias que envolvem a definição de expectativas, fazendo perguntas e se conectar com o objectivo global da sua leitura. Os alunos que tiveram notas mais baixas passaram mais tempo usando estratégias como parafrasear e reler.

Fonte: Migalhas Internacional

STJ: É crime continuado o estupro e atentado violento ao pudor ocorridos no intervalo de menos de um mês


A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu como crime continuado os atos de atentado violento ao pudor e tentativa de estupro realizados contra uma mesma vítima, em circunstâncias semelhantes, com intervalo de menos de um mês. O novo entendimento é fruto da alteração do Código Penal ocorrida no ano passado (Lei n. 12.015/09), que agregou ao crime de estupro (artigo 213) o de atentado violento ao pudor (antigo artigo 214).

O fato diz respeito a um condenado do estado do Espírito Santo que violentou a filha de 10 anos, próximo à casa em que moravam, numa área rural. No primeiro episódio, ele realizou ato libidinoso diferente da conjunção carnal. No segundo episódio, uma semana depois, ele novamente a obrigou a realizar ato libidinoso. Passados mais alguns dias, o acusado tentou manter conjunção carnal com a vítima, não obtendo êxito em razão da chegada de uma pessoa. A pena imposta pela Justiça capixaba foi de 21 anos de reclusão.

A decisão do STJ resultou na redução da pena e baseou-se em voto do relator do habeas corpus, ministro Og Fernandes. O ministro observou que as condições de lugar e maneira de execução são absolutamente semelhantes, sendo o intervalo entre os acontecimentos de menos de um mês. Daí o reconhecimento do crime continuado, inclusive entre os crimes de atentado violento ao pudor e de estupro. A Sexta Turma recalculou a pena em 10 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão.

O artigo 71 do CP, que trata da chamada continuidade delitiva, afirma que, quando o agente, mediante mais de uma ação, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, pelas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, devem os subsequentes serem considerados como continuação do primeiro. Nesses casos, é aplicada a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, com o aumento de um sexto a dois terços.

HC 125207

Fonte: STJ

domingo, 25 de abril de 2010

Eutanásia: aprovada lei de morte digna na Espanha

A conselheira de Saúde da Andalucía, María Jesús Montero, durante sustentação no Parlamento Autônomo da Andalucía para que fosse aprovada a lei de morte digna.

O Parlamento da Andalucía, em Sevilla, Espanha, aprovou, por unanimidade, no dia 17 de março de 2010, lei que versa sobre os direitos e garantias da pessoa em irreversível processo de morte, conhecida por Lei da Morte Digna. A nova norma permite que o paciente possa se negar a submeter-se a um tratamento que apenas prolongue sua vida de maneira artificial.

Segundo os parlamentares, trata-se de uma forma de assegurar a autonomia do paciente e o respeita a sua vontade no momento da sua própria morte. Entretanto, salienta-se que a norma não dispõe sobre a prática da eutanásia, tampouco o suicídio assistido, práticas que, mesmo com a vigência da nova lei, permanecerão proibidas.

A lei da Andalucía é a primeira lei da Espanha que regulamenta os direitos dos pacientes terminais e as obrigações dos profissionais de saúde que os atendem. Além disso, a lei garante que o paciente receba um diagnóstico compreensível sobre suas reais condições de saúde, o que facilitará a tomada consciente de decisões. A lei também dispõe sobre o direito do paciente receber tratamento contra a dor, incluindo a sedação paliativa e cuidados paliativos integrais em domicílio, desde que estes sedativos não sejam contra-indicados.

Ademais, a pessoa em tratamento poderá optar por paralisar qualquer forma de tratamento, até mesmo os já iniciados, quando os mesmos coloquem em risco sua vida.

A aprovação de uma lei como essa abre precedente para que normas semelhantes sejam aprovadas por toda a Espanha. Alguns parlamentares, nesse sentido, defenderam, durante a votação, de que o tema fosse matéria de discussão dos entes governamentais nacionais daquele país.

Fonte: El País

RACISMO: uma interpretação à luz da Constituição Federal

por Guilherme de Souza Nucci

Constitui poder-dever do Judiciário fazer valer os comandos constitucionais vigentes, em particular os que se referem aos direitos e garantias humanas fundamentais. Uma das preocupações do legislador-constituinte baseou-se no combate ao racismo, em busca de uma sociedade igualitária, pluralista e, realmente, democrática. Desse modo, estabelece-se no art. 5º, XLII, da CF, que "a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei". Com base nesse preceito, emergem, basicamente, duas questões: a) o significado de racismo; b) a fonte legislativa de previsão dos tipos incriminadores. Determinando-se o conteúdo do termo e podendo-se visualizar a legislação de apoio ao texto constitucional, resta concluir serem todos os delitos de racismo inafiançáveis e imprescritíveis, necessariamente sujeitos à pena de reclusão.

Certamente, urge levantar, ainda que em breves palavras, o propósito do constituinte ao enumerar três fatores de sustentáculo de combate ao racismo: inviabilidade de liberdade provisória + necessidade de punição a qualquer tempo + sanção penal compatível com o regime de reclusão. A previsão de inafiançabilidade torna-se inútil em face do sistema processual penal vigente, que admite a liberdade provisória, sem fiança, para vários crimes, considerados graves. Logo, o delito de racismo, embora não admita o pagamento de fiança, poderia comportar a liberdade sem a caução legal.

De outra sorte, a imprescritibilidade não faz parte da tradição do Direito Penal brasileiro, até pelo fato de infrações penais muito mais graves comportarem a extinção da punibilidade pelo decurso do tempo, como ocorre com o homicídio, o estupro ou a extorsão mediante seqüestro, apenas para ilustrar. A pena de reclusão, por si só, não representa gravame, pois admite, conforme a pena cominada, os benefícios da Lei 9.099/95 (suspensão condicional do processo ou transação).

Há, no entanto, por trás dessa disposição, um símbolo político-social, configurando uma das metas do Estado Democrático de Direito, qual seja a luta pela igualdade entre todos os brasileiros e a eliminação da discriminação e do preconceito, fatores de corrosão da estabilidade em qualquer sociedade civilizada. Independentemente, portanto, da eficiência e da utilidade dos requisitos idealizados, é fato ser o racismo um crime considerado grave, cuja punição precisa ser imposta pelo Judiciário, quando comprovado.

O racismo é uma postura voltada à visualização de divisão entre os seres humanos, calcada em raças, algumas consideradas superiores às outras, pela existência de pretensas qualidades ou virtudes aleatoriamente eleitas. Cultiva-se, então, um sentimento segregacionista, apartando-se a sociedade em camadas e estratos, merecedores de vivência distinta dos demais. Em verdade, não há raças definidas, distintas e diferenciadas no mundo. Existe apenas a raça humana, com seus naturais contrastes superficiais de aparência, cercados de costumes e tradições diversificadas. Nesse sentido, com razão e sensibilidade, decidiu o Supremo Tribunal Federal em 17 de setembro de 2003 (HC-QO 82.424-RS, Pleno, rel. acórdão Mauricio Corrêa, m. v.).

Assim sendo, pode-se alijar qualquer minoria, quando identificada no seio social, sob o pretexto de ser inferior à maioria discriminatória. Ocorrendo tal situação, identifica-se, perfeitamente, a prática do racismo, tal como idealizado pelo texto constitucional.

Respeitando-se o princípio-garantia da legalidade (não há crime sem prévia definição legal, nem pena sem prévia cominação legal), deve-se buscar na legislação ordinária os delitos constitutivos do racismo, como apregoado pelo referido art. 5º, XLII ("nos termos da lei"). Inexiste qualquer vedação ou limite para a constituição de tipos penais incriminadores, estabelecendo delitos calcados na prática do racismo. Quer isto dizer que a fonte legislativa para tanto deve ser o Poder Legislativo Federal, não importando em qual código ou lei encaixa-se a figura típica.

A Lei 7.716/89, sem dúvida, tipifica alguns dos delitos de racismo, tal como faz crer o seu art. 1º: "Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional". Essa norma de abertura integra os demais tipos penais, que prescindem, então, da motivação expressa, visto já constar do mencionado art. 1º. Ilustrando, o art. 11 preceitua ser crime "impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de acesso aos mesmos". Qual deve ser a motivação? A constante do art. 1º, vale dizer, a discriminação ou preconceito racial. A pena prevista para tal delito é de reclusão, de um a três anos e, por conta do texto constitucional, tal infração é inafiançável e imprescritível.

Indaga-se, entretanto, se somente os delitos constantes da Lei 7.716/89 constituem a prática de racismo, ao que se busca uma resposta negativa. Nada impede a autonomia legislativa para, após a edição da referida lei, criar outras figuras construtivas de crimes de racismo, embora espargidas por outros textos legais. Em nosso entendimento, a injúria racial, prevista no art. 140, § 3º, quando lastreada em discriminação ou preconceito racial, constitui, igualmente, nítida prática do racismo. Aliás, a pena é idêntica ao crime exemplificado (art. 11), constante da Lei 7.716/89, ou seja, reclusão, de um a três anos. Acresce-se a multa. É certo tratar-se de infração penal, cuja iniciativa é condicionada à representação da vítima. Tal medida se dá, exclusivamente, pelo fato de haver relação com a honra. Torna-se justo aguardar a manifestação do ofendido, que saberá o grau de necessidade ou alcance do processo judicial para apurar a culpa do agressor.

Entretanto, quando se visualiza o crime de redução a condição análoga à de escravo, motivada por preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem (art. 149, § 2º, II, CP), tem-se outra prática de racismo, de ação pública incondicionada, cuja pena é de reclusão, de três a doze anos. Nota-se ser a infração penal muito mais grave que as previstas na Lei 7.716/89, já que envolve a liberdade individual. Porém, o fato de ser a liberdade individual um dos bens jurídicos tutelados, não pode olvidar a intenção legislativa de conferir maior punição ao crime, visto abranger a motivação racista. Dessa maneira, o outro bem jurídico tutelado é a igualdade dos seres humanos perante a lei.

Em suma, o racismo importa em exercício de mentalidade segregacionista, visando à superioridade de alguns seres humanos sobre outros, com nítido fator de desagregação social. Deve-se combatê-lo, com vistas à garantia dos princípios norteadores do Estado Democrático de Direito. Dessa meta advém a cautela de não se deixar levar, o operador do Direito, pela singela posição de alguns tipos penais em lei especial (Lei 7.716/89), como se fosse o único cenário para a previsão de crimes racistas. Na esteira de respeito ao princípio da legalidade, deve-se conceber como prática de racismo todos os delitos vinculados a esta motivação, presentes em qualquer lei, inclusive, por óbvio, no Código Penal.

Fonte: Carta Forense

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Reflexão: Um sonho em concreto


"Comecei a meditar sobre Brasília numa manhã de setembro de 1956, quando Juscelino Kubitschek, descendo do carro à porta da minha casa, na Estrada da Gávea, me convidou para acompanhá-lo à cidade e expôs o problema durante o trajeto. Minha primeira reação surgiu do interesse, tanto profissional como afetivo, que esse homem me inspirava : eu via a preocupação de um velho amigo ao qual estava ligado por outros trabalhos, outras dificuldades e por uma longa e fiel amizade. A partir desse dia, comecei a viver em função de Brasília."
Oscar Niemeyer

Há nulidade de processo-crime por ausência de resposta preliminar a denúncia

A falta de notificação dos acusados para o oferecimento de resposta preliminar – de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal (CPP) – tem a força de anular todo o processo-crime, quando gerar prejuízo à defesa. Com esse entendimento, os ministros que compõem a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concederam na terça-feira (20), por votação unânime, Habeas Corpus (HC 95712) a Q.A.G.F. e A.P.M., dois policiais civis acusados pelo crime de concussão.

Após serem presos, os acusados conseguiram liberdade no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) mediante pagamento de fiança no valor de R$ 4 mil. Entretanto, a defesa buscou a anulação da ação penal, uma vez que não teria sido concedido prazo ao réu para questionar a denúncia antes de sua análise pelo juiz, mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus ao entendimento de que no caso não foi demonstrado prejuízo sofrido pelos acusados em razão da falta de defesa preliminar.

Para a defesa, tal fato geraria nulidade, por isso sustentou ilegalidade na condenação de seus clientes, que receberam pena de três anos de reclusão pelo delito de concussão, previsto no artigo 316 do Código Penal. Assim, questionou no STF o acórdão do STJ.

Consta no HC que o juiz da 9ª Vara Criminal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro deixou de expedir notificação aos acusados para apresentação de defesa preliminar, o que, conforme a defesa, significaria ofensa ao artigo 514, do Código de Processo Penal (CPP)*. Esse dispositivo prevê a notificação do acusado para responder por escrito dentro do prazo de 15 dias a acusação feita contra ele pelo Ministério Público.

Para o advogado, a falta de notificação configura nulidade insanável e a inobservância do artigo 514 sempre acarretará prejuízo ao réu pela impossibilidade de se saber que efeito produziria, na subjetividade do magistrado, a defesa preliminar ao próprio juízo de apreciação da denúncia.

Deferimento

Com base em jurisprudência da Corte, o relator do habeas corpus, ministro Ayres Britto, ressaltou que a ausência de notificação prévia constitui vício que gera nulidade processual e deve ser arguida oportunamente sob pena de preclusão. Nesse sentido, ele citou os HCs 91760, HC 89686 e 85779.

Segundo o ministro, o STJ relacionou dois fundamentos para negar o pedido apresentado pela defesa naquele tribunal: a necessidade de oportuno protesto defensivo e a concreta demonstração do prejuízo suportado pelos acusados. Quanto ao primeiro fundamento, Ayres Britto considerou não haver dúvida de que a defesa suscitou, em sede de alegações finais, portanto no curso da instrução, a falta de notificação prévia dos acusados para esse específico fim da resposta preliminar a que se refere o artigo 514, “certo que poderia fazê-lo por ocasião dos respectivos interrogatórios, mas fez na peça das alegações finais”.

Conforme o relator, o artigo 514 do CPP “dá conta da indispensabilidade dessa notificação porque o faz em duas oportunidades: na cabeça e no parágrafo do artigo”. “O destinatário imediato da norma é o juiz, processante do feito, e o parágrafo insiste nessa indispensabilidade”, destaca. Portanto, o ministro Ayres Britto concedeu a ordem tendo em vista que a defesa suscitou em sede de alegações finais a falta do estrito cumprimento ao rito estabelecido no artigo 514 do CPP. “ Parece-me que relativizar a incúria do juiz processante é negar vigência ao próprio dispositivo”, afirmou.

De acordo com o ministro, no caso concreto, a arguição da nulidade processual por falta de notificação é um forte argumento da defesa. Ayres Britto avaliou que o recebimento da denúncia, segundo o artigo. 514 do CPP , é precedido de notificação para defesa preliminar. “ E de fato fica muito difícil aferir se houve prejuízo ou não pela falta de notificação, porque não dá para saber que efeito teria na subjetividade do julgador”.

* Artigo 514, CPP - Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de 15 dias.

Parágrafo único - Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se achar fora da jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a resposta preliminar.


Fonte: STF

Desemprego e falta de dinheiro não autorizam nem justificam roubo, diz TJ


A crise social e as consequencias que ela traz sempre foram temas estimulantes para polêmicos debates nas áreas de humanas, com destaque à sociologia. Qual seria a origem da violência nos centros urbanos é o questionamento que nos leva a associar a crescente criminalidade com a desigualdade social e a falta de oportunidade para o trabalho.

Crimes conta o patrimônio e a participação do tráfico de drogas são caminhos mais rápidos e fáceis para se refazer das dificuldades financeiras, e aqueles que escolhem trilhar o destino do ilícito parecem não temer as suas consequencias: os criminosos quando são pegos e presos se descrevem como vítimas. Não cogitam, em momento algum, que que alguns dos seus alvos também passaram por dificuldades e privações mas, com grande esforço e determinação, seguiram suas vidas de forma humilde e digna na busca da superação dos seus obstáculos.

A decisão que segue tem o cunho de desmistificar a hipocrisia enraizada na justificativa de adentrar no mundo do crime por ser mais um brasileiro miserável.

Karina Merlo


A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, em decisão unânime, manteve condenação a cinco anos e quatro meses de reclusão, em regime fechado, imposta pela Comarca de Gaspar a Elias de Araújo Pires, por crime de roubo qualificado pelo uso de arma de fogo.

Em sua apelação para o TJ, o réu alegou estado de necessidade, e disse ter praticado o crime por se encontrar desempregado e em situação financeira difícil. “A simples alegação de dificuldades financeiras ou desemprego não é motivo plausível para a caracterização da excludente de ilicitude do estado de necessidade, tampouco pode ser admissível para absolver pela prática de crimes dessa natureza, cometidos, inclusive, com violência”, asseverou a relatora do recurso, desembargadora Marli Mosimann Vargas.

De acordo com os autos, Elias, armado, em pleno meio-dia, roubou R$ 541,00 de uma lotérica. Ele confessou que, em momento de desespero, desempregado e sem dinheiro para custear suas despesas de moradia e alimentação, além da pensão alimentícia de seu filho, que mora em Foz do Iguaçu, resolveu praticar o assalto.

“No caso dos autos, não se pode falar em excludente de ilicitude ou em crime famélico, eis que facilmente se vislumbra a possibilidade de o apelante obter recursos, por meios lícitos e dignos, para promover seu sustento e de sua família de forma honesta”, completou a magistrada.

(Apelação Criminal n. 2009.008631-3)

Fonte: TJSC

Crime de embriaguez exige prova de grau alcoólico


A condenação por crime de embriaguez ao volante exige a prova do exato grau de álcool no sangue do acusado. Com esse entendimento, o ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu uma liminar em Habeas Corpus contra homem acusado de dirigir embriagado. Com a decisão, ele se livrou a obrigação de comparecer ao fórum criminal, trimestralmente.

Em recurso, os advogados Francisco de Paula Bernardes Júnior e Filipe Sarmento Fialdini, do escritório Fialdini, Guillon, alegaram que o seu cliente sofreu constrangimento ilegal por ter sido submetido somente a exame clínico, insuficiente para comprovar o estado de embriaguez. Como a comprovação deste tipo de crime exige prova de concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas, segundo o artigo 306 do Código Penal, a ação deveria ser trancada. Essa comprovação só pode ser feita com uso do bafômetro ou exame de sangue.

O homem processado por dirigir alcoolizado foi parado por policiais, quando dirigia na contramão. Ele se recusou a fazer o bafômetro e acabou submetido a exame clínico, em que o médico concluiu que ele dirigia embriagado. No decorrer do processo, ele aceitou o benefício chamado "suspensão condicional do processo" que o obrigou, pelo período de dois anos, a assinar um termo de comparecimento no fórum criminal. Ele também foi proibido de se ausentar do estado sem prévia autorização do juiz.

Na decisão, o ministro acatou a justificativa e entendeu que houve falta de justa causa para instauração de Ação Penal "em razão da inexistência de provas". Com a liminar do STJ, ele não precisará cumprir a suspensão até que o mérito da ação seja julgado pela corte superior. O Supremo Tribunal Federal já deferiu uma liminar semelhante. O ministro Eros Grau suspendeu uma audiência de proposta de transação penal por falta de provas. Neste caso, não foi feito nenhum exame que pudesse constatar o estado de embriaguez do acusado.

Fonte: TJSE
Ilustração: www.botafogo.com.br

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Tribunal confirma que Lei Maria da Penha não pode beneficiar homem


Em habeas corpus impetrado pela Promotoria de Justiça de Crissiumal, a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça decidiu que a Lei Maria da Penha não pode ser aplicada a homens.

O Judiciário de Crissiumal havia concedido medida protetiva a um homem que havia registrado ocorrência policial relatando que sua ex-esposa o perturbava. O hábeas do Ministério Público foi impetrado em favor de Maria Elisabete Schneider Mallmann, que também havia registrado ocorrência relatando que seu ex-esposo, Clodover Mallmann, entrou em seu apartamento e quebrou parte da mobília. Ela representou criminalmente, requerendo medidas protetivas. Entretanto, o Judiciário local concedeu as medidas ao homem, que havia feito o mesmo pedido.

Os desembargadores do Tribunal de Justiça acataram os argumentos do Ministério Público e concordaram que a aplicação dos institutos protetivos da Lei Maria da Penha são aplicáveis somente às mulheres. De acordo com o acórdão, “o homem não está desamparado de abusos praticados pela mulher. No entanto, há outros institutos que garantem seus direitos, que não as medidas da Lei Maria da Penha”.

Para a promotora de Justiça Anamaria Thomaz, “não há contra-senso algum em se buscar a proteção física feminina quando se busca igualdade entre homem e mulher. Ao contrário. A Lei Maria da Penha reconheceu que, apesar de a mulher estar se equiparando aos homens no campo do trabalho, nos valores sociais, na vida afetiva, enfim no seu dia-a-dia, a mulher nunca estará fisicamente igual ao homem”. Acrescenta que “a mulher sempre será vulnerável fisicamente, necessitando, pois, proteção especial do legislador”.

Fonte: MPRS

Em Lei de Talião: "olho por olho, dente por dente", homicida inicia a pena em regime semiaberto


Homem que vingou morte do filho após 13 anos é condenado em São Carlos (SP)

A Justiça de São Carlos (232 km de São Paulo) condenou Agnaldo de Souza Lima, 62, a sete anos de prisão em regime inicial semiaberto pela morte do presidiário Milton Batista do Nascimento, em dezembro do ano passado. Nascimento matou o filho de Lima há 13 anos.

O júri popular começou às 9h da última terça-feira e terminou por volta das 20h. O advogado de Lima, Ulisses Mendonça Cavalcanti, disse que não vai recorrer da sentença. "Conseguimos quebrar as qualificadoras de vingança e motivo torpe e, com isso, reduzimos a pena que, inicialmente, seria de 12 a 30 anos de prisão", disse o advogado.

A Folha não conseguiu ouvir o promotor Marcelo Mizuno, responsável pela acusação, para saber se ele pretende recorrer da decisão do júri.

Lima matou Nascimento a tiros no bairro Cidade Aracy, periferia de São Carlos, em 23 de dezembro de 2009. O presidiário cumpria pena desde 1996, quando matou o filho de Lima, José Roberto. Nascimento havia deixado a prisão em dezembro para passar as festas de fim de ano com a família - ele acabou morto por Lima em um playground.

O julgamento foi presidido pelo juiz Antônio Benedito Morello, que há 13 anos absolveu Lima da acusação de matar outro assassino de seu filho. Em 1996, quando o filho foi morto, Lima conseguiu matar um dos assassinos do rapaz, Rodrigo de Paula, 18, com três tiros. Na época, Lima respondeu em liberdade pelo assassinato, alegou legítima defesa e foi absolvido.

Fonte: Folha OnLine

Bando da degola é suspeito de agir também na Bahia

Em clima de dor e revolta, parentes de Fabiano Ferreira Moura
acompanharam o sepultamento na capital

A influência de Frederico Costa Flores de Carvalho – chefe da quadrilha acusada de assassinar e decapitar os empresários Rayder Rodrigues e Fabiano Ferreira Moura e de torturar pelo menos outras duas pessoas para extorquir dinheiro –, não se limita às divisas de Minas. Contratado por muitos sindicatos ligados ao braço mineiro da Força Sindical, por meio da empresa 404 Comunicação, para promoção de eventos na capital, Contagem, Ouro Branco, Betim e outras cidades do estado, ele também teria usado de seus contatos para assinatura de contratos de prestação de serviços à Força Sindical da Bahia, por meio de uma produtora de eventos mantida em sociedade com o colega de faculdade Ângelo Palhares. Os corpos de Rayder e Fabiano foram enterrados quarta-feira, no Cemitério Parque da Colina, na Região Oeste de BH, em clima de emoção e de confiança na Justiça. Entenda o caso.

Desde meados do ano passado, Ângelo se encontra num vaivém na ponte aérea BH-Salvador para organizar a maior festa da Força Sindical, a de 1º de Maio, Dia do Trabalhador. Ao saber da prisão do amigo, disse “ter ficado perplexo pela crueldade”. Em contato na quarta-feira com Ângelo, que, por acaso, estava reunido na sede baiana da Força Sindical, com a presidente regional da entidade, Nair Goulart, ele negou ter sido favorecido por Frederico para conseguir contratos empresariais. E se limitou a dizer que não sabe “o motivo de sua produtora ter sido ligada ao nome do amigo”. Já a sindicalista disse não conhecer Frederico.

Segundo o titular da Delegacia de Crimes contra a Vida, delegado Wagner Pinto, a polícia já entrou em contato com Ângelo, que deve ser intimado a depor nos próximos dias, para colher informações. “Eles moraram juntos num apartamento no Bairro da Serra e eram sócios numa empresa de eventos”, diz o policial. Ângelo teria feito estágio no escritório de advocacia da mãe de Frederico.

Em Minas, a relação de Frederico Flores com entidades de classe e deputados está estritamente ligada ao seu primo de terceiro grau e ex-sindicalista Carlos Calazans. Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), entre 1987 e 1993, e delegado Regional do Trabalho de 2002 a 2006, Calazans teria apresentado seus contatos ao parente e, com isso, Fred obteve dezenas de contratos de publicidade com sindicatos mineiros.

A parceria familiar teria sido rompida em setembro, depois que o ex-sindicalista foi torturado e extorquido por Frederico. Para investigar o caso, a titular do 1º Distrito Policial, delegada Maria Antônia, pediu a apreensão de todos computadores e documentos da agência de publicidade, o que resultou no fechamento temporário do escritório. Depois disso, o acusado de comandar a quadrilha teria desfeito a sociedade com Vinícius, também vítima do bando. Mas o rompimento não durou muito e ele tentou reaver sua parte na empresa, coagindo o ex-sócio numa sessão de duas horas de tortura e abusos, relatados à polícia na terça-feira, quase dois meses depois.

Suspeito

Além de Ângelo, a titular do inquérito, delegada Elenice Cristine Batista Ferreira, deve convocar mais testemunhas para depor na Delegacia de Homicídios Sul. Está sendo investigada a participação de uma sétima pessoa na execução de Rayder e Fabiano, que tiveram as cabeças e dedos decepados depois de assassinados em apartamento do Bairro Sion, na Região Centro-Sul da capital. Esse suspeito teria ficado com o Citroën C3 de uma das vítimas e o abandonado dois dias depois da prisão de quatro integrantes da quadrilha.

No enterro de Rayder e Fabiano, quarta-feira, comoção de parentes e amigos. Depois de confirmado, por exame de DNA, que os corpos eram mesmo dos dois empresários, o Instituto Médico Legal os liberou para sepultamento, mas a polícia não tem informação sobre o paradeiro das cabeças e dos dedos. A procura foi feita em dois lugares – Aglomerado da Serra e Mata da Mutuca – com ajuda do Corpo de Bombeiros, mas nada foi achado. Os acusados ouvidos até agora negam conhecer o paradeiro dos membros decepados.

Fonte: Uai - Minas

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Advocacia, Ética e Justiça


por Benedito Calheiros Bonfim*

"Nenhum advogado deve aceitar a defesa de casos injustos, – segundo mandamento do Santo Ivo, padroeiro dos advogados, – porque são perniciosos à consciência e ao decoro." No magistério de Paulo Lobo, "não pode o advogado cobrir com o manto ético qualquer interesse do cliente, cabendo-lhe recusar o patrocínio que viole a ética profissional. Não há justificativa ética, salvo no campo da defesa criminal, para a cegueira dos valores diante de interesses sabidamente aéticos ou de origem ilícita. A recusa, nesses casos, é um imperativo que engrandece o advogado". "O advogado não pode, sem proceder ilegitimamente – ressalta Maurice Garçon – é colocar os recursos de sua arte ao serviço do que lhe parece injusto com ajuda de arqumentos que ferem sua consciência". E acrescenta: "O dito, a um tempo irônico e desprestigiante, de que toda causa se defende, é falso. Há causas que o advogado deve recusar. Defende qualquer causa o profissional que só cuida de si e dos seus interesses". Na observação de Eduardo Couture, "as causas não se dividem em pequenas e grandes, mas em justa e injustas. Nenhum advogado é rico bastante para rejeitar causas justas, porque sejam pequenas, nem tão pobre deva aceitar causas injustas, porque sejam grandes".

O advogado tem compromisso com ética, com a moral, com a liberdade, com a verdade, com a justiça, com a sociedade. Como recomenda o nosso Código de Ética, o advogado deve recusar o patrocínio de causa que considere ilegal, injusta ou imoral, ressalvado o direito e dever de assumir a defesa criminal, sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado. Na profissão ou fora dela, o profissional do Direito não pode e não deve ser um alienado ou indiferente ante a injustiça e a violência, entre o justo e o injusto. Não ceda o advogado à tentação, à sedução de aceitar o patrocínio de causas de grande repercussão movido, tão só, pela busca da notoriedade, da fama, do lucro. Daí Ruy Barbosa, exortar os jovens advogados, na "Oração aos moços", a "não fazerem da banca, balcão e da ciência mercatura". No magistério de Eros Grau, "o exercício da advocacia pode ser empreendido tendo-se em vista não remuneração da moeda, mas tão somente o cumprimento da função social, que incumbe ao profissional do Direito, de transformar a sociedade por meios jurídicos". Na lição de Carvalho Neto, "A paixão servil do dinheiro é incompatível com a dignidade da profissão, sendo certo que o advogado, na plenitude do seu nobre oficio, não pode medir os cuidados pela causa segundo o valor dos honorários vencidos e vincendos". O exercício da advocacia – sublinha ainda o Código de Ética –
é incompatível com qualquer procedimento de mercantilização.

Do advogado, a cuja porta a sedução e a tentação batem com freqüência, exige-se, mais do que em qualquer outra profissão, retidão de caráter, sólida formação ética e moral, conduta ilibada.

O que não lhe é licito é, na defesa de seu cliente, seja esfera penal, cível, trabalhista, ou qualquer outra, deturpar ou orientar o cliente a alterar os fatos, falsear a verdade, instruir testemunhas, utilizar de outros expediente ou artifícios sabidamente simulados, enganosos, para burlar a boa-fé do julgador, tudo com o fito de tornar imune ou absolver seu cliente. Assim agindo, estará sendo indigno do preceito constitucional que o alçou à categoria de "indispensável à administração da Justiça". O acusado tem o direito de não se auto-incriminar. Mas o advogado não pode, em todos os casos, máxime naqueles com provas manifestas, documentadas, proclamar, a priori – como não incomumente acontece, até com profissionais de nomeada, a inocência de seu constituinte, como se tivesse endossando o ato criminoso. Cumpre-lhe, isto sim, mostrar as circunstâncias atenuantes do ato do acusado, opor-se aos rigores da pena excessiva, interpretar e demonstrar, quando for o caso, a aplicação errônea da lei, fazer com que os direitos de seu cliente sejam garantidos e respeitados, colaborar com a Justiça. Nunca, porém, lutar pela impunidade do cliente realmente culpado, desenganadamente criminoso.

O emprego de recursos protelatórios, abusivos, aproveitando-se da morosidade da justiça, com o objetivo de, pelo decurso do tempo, obter a prescrição da pena, em crimes como desvio de recursos e de patrimônio público, lavagem de dinheiro, fraudes contra a administração pública, sonegação, tem sido uma estratégia de advogados até de nomeada para conseguir a impunidade de seus clientes. O profissional que assim age se exclui do princípio constitucional de que "O advogado é indispensável à administração da Justiça".

É preciso não esquecer que o amesquinhamento da advocacia contribui para o rebaixamento do Judiciário, tal o grau de inter-relação, interdependência entre ambas as duas categorias. Como bem ponderou Carvalho Santos, "em se elevando uma, a outra também se eleva. São as duas que se deprimem, quando um tenta diminuir a outra".

* Benedito Calheiros Bonfim é Advogado, Membro da Academia Nacional do Direito do Trabalho, Ex-Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros e Ex- Conselheiro Federal da OAB.

Fonte: Editora Magister

Vidro quebrado para furtar som em veículo não qualifica o crime, decidiu o STJ


A destruição do vidro de automóvel para a subtração de objeto que se encontra no seu interior não caracteriza qualificadora para o crime de furto. A decisão da 6ª turma do STJ é o primeiro precedente neste sentido e pode alterar a jurisprudência da Corte. Os ministros levaram em conta o princípio da proporcionalidade da pena, porque, quando o vidro é rompido para se furtar o próprio veículo, o crime é considerado simples.

A qualificação do furto pode dobrar a pena se comparada àquela prevista para o furto simples. Enquanto o crime simples é punido com reclusão de um a quatro anos, o crime qualificado pode resultar em uma condenação de dois a oito anos de prisão. A qualificadora de rompimento de obstáculo é prevista no parágrafo 4º do artigo 155 do CP (clique aqui).

O caso analisado aconteceu na cidade de São Paulo. O ladrão quebrou o vidro do carro e subtraiu a frente removível do aparelho de som. O furto foi percebido por "populares", que perseguiram o ladrão. O relator do HC julgado é o ministro Nilson Naves e a decisão foi por maioria – quatro votos a um.

Para o ministro relator, não se pode destinar pena mais grave àquele que, ao quebrar o vidro, furta somente o aparelho de som. O relator afirmou que o princípio da proporcionalidade veda toda sanção injustificável quando comparada com a consequência prevista para a hipótese mais grave em abstrato.

Até então, os ministros dos dois órgãos julgadores de Direito Penal no STJ – 5ª e 6ª turma – vinham entendendo que o furto de som em veículo era qualificado, pelo rompimento do obstáculo (o vidro do carro em si).

A 6ª turma reavaliou a questão. Para a maioria dos ministros, não há como considerar o vidro do veículo um obstáculo apto a configurar a qualificadora constante do CP. "Trata-se [o vidro] de coisa quebradiça, frágil, que, no mundo dos fatos, não impede crime algum nem é empregada com essa finalidade pelo proprietário", ponderou o ministro Naves. Apenas o desembargador convocado Haroldo Rodrigues votou no sentido contrário, que mantinha a qualificadora.

•Processo Relacionado : HC 152833 - clique aqui.

Fonte: Migalhas

Pulseiras do sexo: brincadeira ou crime hediondo?


por Luiz Flávio Gomes

O jogo sexual da moda se chama "Snap". Veio da Inglaterra. Entre adultos - que atuam com consciência, vontade e liberdade - pode até ser divertido. Quando envolve menor de 14 anos entra em campo o Direito Penal (foi isso que ocorreu em Londrina), porque no Brasil está proibido qualquer tipo de sexo com pessoas menores de catorze anos.

A cor de cada pulseira de silicone determina o ato libidinoso que vai ser praticado. Tudo depende de qual pulseira você consegue arrancar da parceira do jogo.

As cores e os seus significados são os seguintes: amarela = abraço; rosa = mostrar o peito; laranja = dentadinha de amor; roxa = beijo com a língua; vermelha = dança erótica; verde = sexo oral praticado pelo rapaz; branca = a menina escolhe o ato; azul = menina faz sexo oral; preta = sexo com quem arrebatou a pulseira; dourada = tudo é possível (Fonte: Vitor Ferri – Rede Gazeta).

O "jogo do amor" (melhor seria dizer "o jogo da libido") não pode passar de uma brincadeira, entre adultos, livres e conscientes. Cuidado (ligue seu sinal amarelo): está proibido o envolvimento de menor de catorze anos assim como a violência ou a grave ameaça. O jogo foi inventado - aparentemente - pelo sexo masculino. Mas note-se que as pulseiras devem ser usadas pelas meninas. O jogo existe para satisfazer, em princípio, a libido de ambos. Mas por detrás dele, em razão do arrebatamento da pulseira, pode haver um misto de fraude ou de violência e é isso que deve ser evitado, para não se chegar em problemas penais.

A brincadeira entre adultos faz parte do mundo divertido do sexo. Ocorre que, em Londrina, o jogo envolveu uma garota de 13 anos e isso significa ato sexual com pessoa vulnerável, que é crime hediondo. A Justiça de Londrina proibiu o uso e a venda das pulseiras, para menores, na localidade. A notícia chama a atenção e remete à reflexão conjunta com outra medida que vem sendo constantemente adotada por juízos de primeira instância: o toque de recolher.

A nosso ver, ambas as medidas (a proibição do uso e da venda das pulseiras do sexo quando se trata de menores e a imposição de que eles estejam acompanhados dos seus responsáveis após determinado horário em lugares públicos), desde que bem delimitadas e bem definidas (sem que haja excesso ou abuso), são compatíveis com o sistema de medidas protetivas que integram a política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, previstas pelo ECA (clique aqui). Essas medidas podem concretamente diminuir os alarmantes índices de envolvimento de menores na prática de infrações penais no país.

O CNJ, após várias manifestações, em novembro do ano passado, decidiu não tomar conhecimento das portarias emitidas pelos juízes que limitavam o horário de crianças e adolescentes na rua. De acordo com o ministro Ives Gandra Martins Filho não cabe ao CNJ atuar diretamente na matéria, mas apenas estabelecer parâmetros gerais que sirvam para que cada TJ verifique se o juiz está resolvendo um problema específico. Na oportunidade, o mesmo Ministro ressaltou que a medida é salutar, mas que dependia da colaboração de todos para seu efetivo sucesso.

Assim também pensamos com relação ao uso das pulseiras do sexo. A sexualidade é tema multidisciplinar, mas o Estado não deixou de impor certos parâmetros, tais como a delimitação da idade de 14 anos para fixar a vulnerabilidade sexual de uma pessoa. A lei 12.015/09 (clique aqui) incluiu no CP (clique aqui) o artigo 217-A, que prevê o estupro de vulnerável: ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menor de 14 anos.

Da mesma forma como o toque de recolher, a despeito de ser medida salutar, depende da colaboração popular. A conscientização dos menores quanto ao uso das pulseiras também deve ser objeto de condutas e iniciativas articuladas da sociedade, tendo em vista que elas sugerem a adesão a um jogo de cunho sexual e muitos jovens não estão suficientemente preparados para discernir o risco que uma brincadeira dessas pode implicar. Tanto assim que no episódio ocorrido em Londrina constatou-se a prática de crime hediondo - ato sexual com pessoa vulnerável - envolvendo vários rapazes, alguns menores de idade.

Conclusão: o que aparentemente é um "jogo divertido" pode se transformar em delito classificado como hediondo (estupro ou ato sexual com pessoa vulnerável). Da diversão para a cadeia estamos a um passo. E é bom recordar que na cadeia os que aqui fora arrebatam pulseiras passam a ser os usuários delas. No mundo desumano e cruel dos presídios, de outro lado, só vale a cor dourada (tudo é imposto). Disso tudo é que todos devem ter consciência. Evitando-se todas as implicações penais acima recordadas, escolha a sua cor predileta e avante!

Fonte: Migalhas