Criado em 2005 para promover o controle externo do Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresenta um balanço digno de nota, apesar de sua curta existência. Ele criou condições para profissionalizar a gestão dos tribunais. Introduziu políticas de produtividade para os tribunais, coibiu o nepotismo, proibindo juízes e desembargadores de contratar parentes, promoveu correições e afastou magistrados - inclusive um ministro do Superior Tribunal de Justiça - acusados de corrupção.
Mas, apesar desse balanço, há quatro meses o CNJ atravessa um período de turbulências que pode comprometer sua atuação e até desfigurá-lo. Tudo começou quando o ministro Gilmar Mendes foi substituído por Cezar Peluso na presidência do órgão, em abril. Ele é o primeiro juiz de carreira a dirigir o CNJ.
Até então, a presidência do CNJ fora ocupada por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) oriundos de fora dos quadros da magistratura. O primeiro presidente, Nelson Jobim, foi parlamentar e ministro da Justiça, antes de ser indicado para o STF. Ellen Gracie era desembargadora do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, tendo assumido a vaga do quinto constitucional reservada ao Ministério Público (MP). E Gilmar Mendes foi procurador da República e chefiou a Advocacia-Geral da União.
Por isso, o CNJ permaneceu imune às pressões do corporativismo em seus cinco anos de existência.
Nos meios forenses, a dúvida era se Peluso manteria as diretrizes de seus antecessores ou se tentaria alterá-las, atendendo os colegas de carreira.
Durante a votação da Emenda Constitucional n.º 45, em 2004, as entidades da magistratura se opuseram à criação do CNJ, que era fortemente apoiada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). E, quando o órgão começou a funcionar, em 2005, esbarrou na oposição dos Tribunais de Justiça, que ainda hoje resistem a mandar para Brasília as estatísticas e os documentos solicitados. O principal foco de resistência foi o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), onde Peluso foi desembargador. A tensão atingiu o auge no ano passado, quando o CNJ determinou a suspensão do "auxílio-voto" que o TJSP pagava a juízes paulistas e abriu uma reclamação disciplinar contra o presidente da Corte, por ter se recusado, três vezes, a remeter as informações ao relator do caso.
Na primeira sessão do CNJ que presidiu, Peluso discutiu com um conselheiro que representa a sociedade civil. Dos 15 integrantes do órgão, 9 são oriundos da magistratura, 2 são indicados pelo MP, 2 representam a OAB e 2 são escolhidos pela Câmara e pelo Senado como representantes da sociedade civil. Depois ele deixou de convocar o conselho consultivo de pesquisas do CNJ. Ele é integrado por 9 especialistas em criminologia, planejamento, ciência política, meio ambiente e economia, que trabalham de graça e orientam a elaboração de estudos e levantamentos em áreas nas quais os juízes auxiliares do CNJ não têm preparo técnico.
Por ocasião do julgamento do ministro Paulo Medina, Peluso propôs que a sessão fosse fechada, sendo que os julgamentos são públicos, por determinação da Constituição. Na semana passada, ele encaminhou ao governo uma Proposta de Emenda Constitucional que assegura uma cadeira no CNJ para o Superior Tribunal Militar e outra para o Tribunal Superior Eleitoral. A iniciativa, que já havia sido aventada antes, tendo recebido críticas da OAB, do MP e do Executivo, é considerada nos meios forenses como uma tentativa de alterar o equilíbrio de forças no CNJ.
Essa semana, Peluso adotou nova medida polêmica. Alegando que os julgamentos do CNJ "expõem" os magistrados e que a Corregedoria Nacional de Justiça só deveria atuar de "forma subsidiária", ele anunciou que vai deixar a maioria das atividades correcionais do órgão para as Corregedorias das Justiças estaduais. Mas, como as inspeções do CNJ têm mostrado, a eficácia dessas corregedorias está comprometida pelo corporativismo. E uma das justificativas para a criação do CNJ foi que só o controle externo da Justiça poderia pôr fim ao corporativismo.
A OAB e o MP já protestaram contra a iniciativa de Peluso, ampliando a crise no CNJ.
Fonte: Estadão
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