sábado, 18 de setembro de 2010

Último dia da Conferência Iberoamericana de Direito Penal

Duas palestras se destacaram e fizeram o sol de Salvador brilhar neste sábado. Emílio Viano (Professor doutor da American University, Washington,DC, USA)e Leonardo Boff (filósofo, teólogo e professor) proferiram as melhores palavras do dia.


Karina Merlo e Emilio Viano

O Prof. Emílio Viano, abordando o tema Justiça Restaurativa, realizou uma avaliação do lugar da vítima no processo penal, lembrando que o poder punitivo se caracteriza pela confiscação da vítima, cujo lugar é usurpado há cerca de um milênio pelos soberanos em qualquer de suas formas políticas. A vítima deixou de ter um tratamento de pessoa, de indivíduo, de ser humano, para ser apenas um dado do processo. Por isto, diz o Professor, o modelo punitivo não é de fato um modelo de solução de conflitos, mas sim um exercício vertical de poder dos mandatários. Alertou para a pessoa do juiz como um meio de efetivar os principais objetivos da justiça restaurativa - a conciliação, por exemplo.

"É essencial refletir sobre o direito do cidadão de viver como quer, respeitando a lei e, por outra parte, a necessidade de tomar em conta certas realidades que podem aconselhar limites razoáveis. Desafortunadamente existem valores culturais, morais e até legais, que aproveitam estas realidades para lançar sobre a vítima a culpa da agressão. Este prejuízo não só tem implicações negativas para o sistema criminal de justiça, no sentido que o grau de culpabilidade do delinqüente é matizado pelas ações da vítima, mas também para a sociedade, dado que a proteção será proporcionada pelo controle crescente do estado e da comunidade sobre o indivíduo. Esta perspectiva, levada a seu extremo lógico, poderia conduzir a uma mentalidade de sítio e a uma sociedade que se dirigisse para um controle e vigilância crescentes, fortificação de residências, restrição na liberdade de movimentos e proliferação de armas para autodefesa."

Leonardo Boff ficou encarregado de encerrar a Conferência, que completou três dias de exaustivos debates e explanações. O grande filósofo da atualidade falou sobre direito, ética e meio ambiente. Foi uma bela palestra, diferente daquilo que os juristas estão acostumados a vivenciar em eventos que prezam o lado mais normativo para desentranhar algo de bom no meio do caos em torno do sistema penal.

Em suma, constatado o fato de que a humanidade destrói a terra ao seu limite de tal forma que estamos a beira de uma catástrofe ecológica, Boff propõe uma nova ética, uma ética tripartite, do cuidado, da responsabilidade e da cooperação. Esta ética permitiria a construção de uma nova democracia, sócio-cósmica, na qual os direitos da terra seriam declarados e respeitados. A visão antropocêntrica e localista seria suplantada por um pacto compassivo por todas formas de vida e sem limites territoriais. Um novo direito teria que surgir, tendo como valor central a mãe terra (Gaia) - uma visão difícil de ser aceita pela lógica econômica e instrumental do mundo atual.

Duas frases de Boff me chamaram atenção: "A Terra não precisa do homem, mas indiscutivelmente os homens precisam da Terra"... "Tudo aquilo que eu amo, eu cuido. E tudo aquilo que cuido, eu amo".

Um jeito fraterno e tocante, que só mesmo a pessoa de Leonardo Boff consegue transmitir, o cativante teólogo emocionou todos presentes no auditório lotado quando reproduziu a Oração de São Francisco de Assis e encerrou a sua fala com a seguinte reflexão: "a ciência não vai a lugar algum sem CONSciência".

Karina Merlo


Karina Merlo e Leonardo Boff

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