sexta-feira, 19 de março de 2010

Sistema prisional brasileiro revive a Idade Média


"Uma pena, para ser suplício, deve obedecer a três critérios principais: em primeiro lugar, produzir uma certa quantidade de sofrimento que se possa, se não medir exatamente, ao menos apreciar, comparar e hierarquizar; a morte é um suplício na medida em que ela não é simplesmente privação do direito de viver, mas a ocasião e o termo final de uma graduação calculada de sofrimentos: desde a decapitação - que reduz todos os sofrimentos, a um só gesto e num só instante: o grau zero do suplício - até o esquartejamento que os leva quase ao infinito, através do enforcamento, da fogueira e da roda, na qual se agoniza muito tempo; a morte - suplício é a arte de reter a vida no sofrimento, subdividindo-a em "mil mortes". (Foucault, Vigiar e Punir, Ed. Vozes, 1997, pag:31)

O sentimento de revolta e vingança predomina nos brasileiros que sofreram algum tipo de violência ou vivenciaram a perda de um parente, de um amigo ou de um desconhecido que o fez lembrar que a realidade cruel se faz cada vez mais próxima do seu quotidiano.

O Brasil, de forma correta, bane penas cruéis e de morte, assim como aquelas de caráter perpétuo. Infelizmente, muitos são os que apóiam a iniciativa da pena de morte. E para quê? Será que homens de bem devem se tornar criminosos ao ponto de se igualar com os indivíduos de baixo caráter para ter a sensação de uma justiça efetiva? Claro que não. O que se faz necessária é um justiça ágil e que aplique as medidas punitivas proporcionais ao crime cometido, devendo o castigo dos criminosos ser cumprido à luz da lei. Porém, excetuando-se os casos de prisão ilegal, o que a sociedade vitimizada não consegue tolerar é a liberdade antecipada de indivíduos que são responsabilizados por crimes repugnantes devido à superpopulação no sistema carcerário.

O sentimento de insegurança permeia a sociedade, a qual é obrigada a conviver com os criminosos por falta de vagas nas prisões. E a ressocialização é uma utopia que cada vez mais é inserida nos discursos de políticas governamentais e nem, ao menos, consegue ser efetivada ou sair do papel.

A convivência entre os presos remete ao tempo da Idade Média: vale a tortura, o esquartejamento e a morte - retratando a supremacia dos direitos desumanos em detrimento da sobrevivência. O Estado fecha os olhos para tudo isso e depois faz o seu discurso de ressocialização - como se houvesse alguma esperança de recuperação para os presos que foram submetidos à degradação de todos os valores humanos.

No sentido abordado por Thompson, em 2003, “presenciei a entrada de um jovem de aproximadamente 20 anos no PDF-I. Estava condenado por latrocínio, tinha participado de um furto de som automotivo, que culminou na morte da vítima. Segundo o presidiário, não queria matar a vítima, apenas desejava o som para "curtir as baladas". Todavia, a curtição acabou se tornando num crime. O jovem era primário, porém cometeu um crime hediondo. Teve pena imposta de 21 anos. No início, era tímido, falava sem dirigir o olhar aos policiais. Contudo, foi-se adaptando à cadeia. Para sobreviver sem problemas, afundou-se na massa carcerária, adotando seu estilo de vida. Começou a fazer algumas "correrias" e "adianto" para demonstrar aos demais presidiários que era um dos seus. Passado algum tempo, nada tinha daquele jovem tímido e amedrontado. Via-se nele um criminoso, que no pátio praticava exercícios físicos para se impor, além de dirigir olhar desafiador aos seus supostos algozes, ou seja, os policiais. Enfim, já estava perdido, fazia de fato parte do mundo do crime. Contudo, por artimanha jurídica, houve revisão em sua pena, sendo retirado o caráter hediondo do crime. Assim, ele seguiu direto para o regime semi-aberto, tanto que hoje pode já estar em liberdade. Todavia, tenho dúvida quanto ao seu destino, pois ele tinha sido contaminado pelo crime na prisão." (THOMPSON, Augusto. Questão penitenciária... pag. 96)

A criminalidade é o câncer atual da nossa sociedade e os nossos governantes estão negligenciando o tratamento. Nenhum remédio, por mais eficaz, conseguirá surtir efeito quando for alcançado o estágio terminal. O descaso terá que ser substituído por um modelo prisional que dignifique o preso ao patamar de ser humano, não dando chance à prevalência do crime organizado ou da criminalidade no cárcere. Cabe aos órgãos públicos responsáveis, a implementação de programas visando a humanização, estimulando o preso ao trabalho, a alguma atividade que o faça se reconhecer como um ser útil à sociedade. Uma vez provada a sua capacidade de “servir”, ele poderá se habilitar à liberdade.

Karina Merlo

Um comentário:

Lô Silva 2012 disse...

Bom dia,

Fico sim é assustada com a lentidão da justiça, o desinteressde, o gasto compapel infindávelmente com textos latim, grego, palavras e formas quase extraterrestre,mas que não tem efeito prático na vida de quem acaba lá
Abraços