sexta-feira, 19 de março de 2010

Vigília contra a violação dos direitos humanos no ES


Representantes de movimentos sociais, estudantis e religiosos realizaram vigília na segunda-feira (15), em frente ao Palácio Anchieta, contra tortura, esquartejamento e maus tratos de presos no Espírito Santo. O ato público começou às 09h, mesmo horário em que denúncias contra o sistema prisional capixaba estavam em discussão no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra.

O documento foi elaborado pela Justiça Global e Conectas com base em depoimentos de detentos e de visitas à delegacias, Departamento de Polícia Judiciária e penitenciárias. Da denúncia, também constam relatos referentes à Casa de Custódia de Viana como esquartejamentos, superlotação, avançado estado de deterioração dos prédios, ausência de grades entre as celas, falta de energia elétrica e de chuveiros, além da proliferação de insetos e ratos, de acordo com vistoria do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) realizada no ano passado em algumas cadeias do Estado.

O CNPCP é um órgão do Ministério da Justiça que tem entre outras as atribuições legais, inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais nos Estados. Na época, o então presidente do Conselho, Sérgio Salomão Shecaira, frisou que, no presídio, em Viana, administrado pela secretaria Estadual de Justiça, os detentos não estavam somente condenados às penas impostas pela Justiça - quando é o caso de presos julgados. Eles viviam a própria sorte.

Em abril de 2009, Shecaira salientou que na entrada da Casa de Custódia de Viana tinha três celas vizinhas destinadas a trânsito e a seguro. "Os presos do seguro imploraram por suas vidas. Disseram que a vida deles, ali ao lado dos presos em trânsito, estava em risco. A administração do presídio disse nada poder fazer", detalhou o documento assinado por Salomão Shecaira.

Esquartejamentos

O relatório do CNPCP, na ocasião da vistoria, também denunciou maus tratos e assassinatos nos presídios. "Nos últimos anos, há denúncias de vários corpos de presos esquartejados. Quando os corpos são achados - ou ao menos partes deles - a administração reconhece as mortes. Quando não são encontrados, a administração afirma supor ter havido fuga. Visitamos os pavilhões cercados por guardas armados. Tentaram nos impedir a visita alegando problemas de segurança. No contato com os presos soubemos dos casos de tortura. Atendimento médico inexiste. Flagramos presos com doenças de pele. A escabiose, em um dos casos, toma todo o tronco de um interno. Na véspera de nossa chegada, os presos foram obrigados a limpar os pavilhões. Por não haver colaboração dos condenados, a Polícia Militar disparou vários tiros. Recolhemos cápsulas de revólveres, fuzis e balas de borracha", descreveu.

Torturas

As denúncias de violação dos direitos humanos, segundo relatório do CNPCP, elaborado em 2009, envolvem ainda episódios de tortura, conforme relatou Salomão Shecaira ao então procurador da República, Antônio Fernando de Souza. "Também encontramos vários presos denunciando torturas. O local apontado como sendo o da prática de martírios está desativado, segundo a administração. Trata-se de uma cela escura, com goteiras internas, e que se encontrava fechado com um cadeado. A tranca era nova e não apresentava quaisquer sinais de ferrugem. Pareceu-nos estar em plena atividade. Ademais, foram muitas as reclamações das torturas por parte de presos. No dia seguinte, conversando com advogados na sede da OAB/ES, verificamos que as denúncias de tortura eram recorrentes".

Celas metálicas

Ainda no ano passado, a visita do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária se estendeu ao presídio de celas metálicas, em Novo Horizonte, na Serra. No local, novas constatações de irregularidades. Com capacidade para 144 presos, nos dias da visita, 16 e 17 de abril de 2009, havia quase quatrocentos internos.

Assim como na Cascuvi, o então presidente do conselho, Sérgio Salomão Shecaira, observou que o presídio era absolutamente insalubre. "A temperatura, no verão, passa de 45 graus, segundo vários depoimentos. Não há qualquer atividade laboral, não há médico, não há advogado, não há defensoria pública, assim como não há privacidade alguma. As visitas semanais são feitas através de uma grade farpada. São fatos comuns também as crianças se cortarem ao tentar pegar na mão dos detentos por entre as grades", informou Shecaira em seu relatório.

"Sob as celas encontramos um rio de esgoto. Na água preta e fétida encontravam-se insetos, larvas, roedores, garrafas de refrigerantes, restos de marmitas, restos de comida, sujeiras de todos os tipos. A profundidade daquele rio de fezes e dejetos chegava a quarenta centímetros, aproximadamente. O cheiro era de causar náuseas. Todos nós chegamos à conclusão que nunca havíamos visto tão alto grau de degradação. Poucas vezes na história, seres humanos foram submetidos a tanto desrespeito. Vencendo a repugnância do odor, aproximamo-nos dos presos. Novas denúncias de comida podre e de violências. Encontramos um preso com um tiro no olho e outro com marcas de bala na barriga. Marcas de balas na parte externa dos containers são comuns. A promiscuidade impera. Violências entre presos e contra presos foram denunciadas" , enfatiza o documento do conselho.

Reunião na ONU

As observações feitas pelo Conselho e postas no relatório das ONGs Justiça Global e Conectas serão tema de uma das mesas redondas da 13ª Reunião Anual do Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) nesta segunda-feira (15), em Genebra, na Suíça.

O presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos no Estado, Bruno Alves de Souza Toledo, é o representante capixaba no encontro. Bruno destacou que o convite da Organização das Nações Unidas é uma mostra de que os problemas relatados pelas entidades de direitos humanos são de interesse internacional.

"Quando a Organização das Nações Unidas abre esse espaço é porque a ONU verifica que os comunicados sobre as situações que constatamos são graves e merecem ser debatidas na mais alta instância de direitos humanos do planeta. A Justiça Global e a ONG Conectas, que têm cadeira no conselho da ONU, já visitaram o Estado e constataram as irregularidades nas unidades prisionais. Foram essas duas entidades que decidiram levar o problema para a maior autarquia dos direitos humanos", relatou.

Fotos e vídeos sobre as irregularidades constatadas serão expostos durante a mesa redonda. Um dos casos que será levado ao conhecimento da ONU, segundo Bruno, é a situação do Centro de Detenção Provisória de Cariacica (CDP). Ele salientou que neste local os presos continuam abrigados em celas metálicas, em situação insalubre.

Secretaria de Justiça

Por nota, a Secretaria da Justiça do Espírito Santo informou que este ano haverá uma série de inaugurações de unidades prisionais, que devem criar mais de cinco mil vagas. A Sejus destaca que desde o início do atual Governo já foram inauguradas 16 unidades prisionais no Espírito Santo. "Com investimentos que superam a marca de R$ 200 milhões, de recursos próprios do Estado, o Espírito Santo se firma como o Estado brasileiro que mais investe na estruturação do seu sistema prisional, proporcionalmente à sua população", diz a nota.

Estado assina acordo com o CNJ

Acordo

O Governo do Estado e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) firmaram no dia 10 de junho de 2009 um Termo de Compromisso que estabelece ações de melhoria no sistema prisional e de atendimento socioeducativo capixaba.

Entre as metas do termo estão a criação de 5.587 novas vagas no sistema prisional do Estado até agosto de 2010, a criação de 500 novas vagas no sistema de atendimento socioeducativo, a realização de concurso público para a contratação de agentes penitenciários e defensores públicos e a extinção do uso de celas modulares (metálicas) no Espírito Santo.

Conforme o cronograma estabelecido no termo, serão criadas 2.872 novas no sistema prisional até o final de 2009 e outras 2.715 vagas até agosto de 2010. Também serão inauguradas, no primeiro semestre de 2010, quatro unidades de internação e internação provisória de adolescentes em conflito com a lei.

Entre as metas do termo está a desativação da Unis, localizada em Cariacica-Sede, que funciona em um prédio antigo e que não oferece condições de ser adequado para se enquadrar no modelo de atendimento implementado pelo Iases, previsto no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).

A desativação dessa antiga unidade é precedida pela abertura de novas vagas no sistema e, nesse sentido, foi entregue neste ano, o Centro Socioeducativo de Atendimento ao Adolescente em Conflito com a Lei (CSE), localizado em Tucum, Cariacica, com 80 vagas, sendo 60 ofertadas na estrutura do Centro e outras 20 no sistema de Casas Repúblicas.

Além das novas vagas criadas em 2009 com o Centro Socioeducativo, serão construídas, neste ano, mais quatro novas Unidades. Serão implantadas Unidades de Internação Socioeducativas e de Internação Provisória, no Sul, em Cachoeiro de Itapemirim, e uma no Norte do Estado, em Linhares, com a oferta de 90 vagas de internação e 60 de internação provisória em cada unidade.

Também serão construídas mais duas unidades na Região Metropolitana da Grande Vitória: Unidade de Internação Provisória II com 80 vagas e Unidade Metropolitana de 18 a 21 anos, com previsão de 120 vagas. Totalizando assim 500 novas vagas no sistema de atendimento socioeducativo do Estado até 2010.


Fonte: Gazeta on line

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