SAN JOSÉ (AFP) - O Brasil defendeu nesta sexta-feira sua lei de anistia, em uma audiência na Corte Interamericana de Direitos Humanos, acionada por familiares de vítimas da ditadura militar.
O representante do governo brasileiro foi o último a falar no segundo dia de audiências sobre o caso Gomes Lund, envolvendo a repressão à "Guerrilha do Araguaia", onde as forças do regime militar teriam torturado e assassinado mais de 70 pessoas entre 1972 e 1975.
"A Lei de Anistia brasileira é parte de um processo 'sui generis' muito complexo e constitui um pilar do processo de redemocratização", no qual se apoiaram os diversos setores da sociedade, argumentou o embaixador brasileiro em San José, Tadeu Valadares, que representa Brasília na audiência.
Segundo o diplomata, a lei de anistia foi produto de "um pacto nacional" que permitiu a redemocratização e a reconciliação da sociedade brasileira, e sua revogação é um risco para a estabilidade do país.
Tadeu Valadares lembrou que o Estado brasileiro admitiu sua responsabilidade pelos crimes durante a ditadura e procurou indenizar as famílias das vítimas.
O diplomata destacou que o Brasil já pagou mais de 3,7 milhões de dólares em indenizações e permanece em busca dos desaparecidos vítimas da repressão.
Tadeu Valadares respondia ao jurista colombiano Rodrigo Oprimi, que afirmou que no Brasil subsistem "enclaves autoritários" devido à falta de justiça com as vítimas da ditadura militar.
Segundo Oprimi, "nos casos em que houve verdade e julgamento, há muito mais gozo do direito à vida. Onde não há esses processos (como no Brasil), tende-se a permitir enclaves autoritários gerados pela impunidade", disse Oprimi, que participou do processo como especialista apresentado pelas famílias das vítimas.
Oprimi, especialista em justiça em períodos de transição política, admitiu que o Brasil conseguiu consolidar uma democracia sólida após o fim da ditadura, mas lamentou que ainda subsistam manifestações autoritárias que, a seu ver, ocorrem porque os crimes contra a humanidade nunca são esclarecidos.
Nas transições da ditadura para a democracia "os estados têm a obrigação de cumprir os preceitos de justiça integral, o que inclui o esclarecimento da verdade, a aplicação da justiça para os violadores dos Direitos Humanos e a reparação ou indenização das vítimas".
No Brasil não houve um processo de estabelecimento da verdade, e por isso "as garantias de não repetição (das violações dos DH) são precárias", advertiu Oprimi.
Na quinta-feira testemunhou o ex-procurador brasileiro Belisário dos Santos, integrante da comissão que investigou o paradeiro dos desaparecidos no Araguaia, sem maiores resultados, devido à falta de colaboração dos chefes militares.
Belisário dos Santos disse que, graças ao trabalho da comissão, foi indenizado um importante número de vítimas ou suas famílias, mas admitiu que não se pôde cumprir com a expectativa dos parentes, que é achar os restos dos desaparecidos e identificar os responsáveis por sua morte.
A Corte também ouviu o testemunho de Laura Petit da Silva, cuja irmã Lúcia foi executada extrajudicialmente em 1972 e cujos restos não foram encontrados até 1996.
Laura relatou que, durante os 24 anos que durou a busca de sua irmã, "não houve qualquer disposição de colaborar por parte de nenhum agente do Estado" e, ao contrário, os esforços da polícia para obter justiça sofreram obstáculos.
Os parentes das vítimas são representados pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), cuja diretora executiva, Viviana Krsticevic, criticou a falta de cooperação das autoridades e tribunais brasileiros.
CEJIL recordou que as resoluções da ONU e a jurisprudência de tribunais internacionais foram claras a respeito das leis de anistia que não podem ser alegadas como razão para não investigar o paradeiro de desaparecidos políticos.
Também não podem ser evocadas para uma negativa de identificar e castigar os autores de graves violações dos direitos humanos, afirmou Krsticevic.
Uma vez finalizada a audiência desta sexta, será aberto um período para a recepção e incorporação à causa de alegações por escrito até 21 de junho, depois do que a Corte emitirá uma sentença em um prazo ainda não estabelecido.
Fonte: Agence France-Presse
O representante do governo brasileiro foi o último a falar no segundo dia de audiências sobre o caso Gomes Lund, envolvendo a repressão à "Guerrilha do Araguaia", onde as forças do regime militar teriam torturado e assassinado mais de 70 pessoas entre 1972 e 1975.
"A Lei de Anistia brasileira é parte de um processo 'sui generis' muito complexo e constitui um pilar do processo de redemocratização", no qual se apoiaram os diversos setores da sociedade, argumentou o embaixador brasileiro em San José, Tadeu Valadares, que representa Brasília na audiência.
Segundo o diplomata, a lei de anistia foi produto de "um pacto nacional" que permitiu a redemocratização e a reconciliação da sociedade brasileira, e sua revogação é um risco para a estabilidade do país.
Tadeu Valadares lembrou que o Estado brasileiro admitiu sua responsabilidade pelos crimes durante a ditadura e procurou indenizar as famílias das vítimas.
O diplomata destacou que o Brasil já pagou mais de 3,7 milhões de dólares em indenizações e permanece em busca dos desaparecidos vítimas da repressão.
Tadeu Valadares respondia ao jurista colombiano Rodrigo Oprimi, que afirmou que no Brasil subsistem "enclaves autoritários" devido à falta de justiça com as vítimas da ditadura militar.
Segundo Oprimi, "nos casos em que houve verdade e julgamento, há muito mais gozo do direito à vida. Onde não há esses processos (como no Brasil), tende-se a permitir enclaves autoritários gerados pela impunidade", disse Oprimi, que participou do processo como especialista apresentado pelas famílias das vítimas.
Oprimi, especialista em justiça em períodos de transição política, admitiu que o Brasil conseguiu consolidar uma democracia sólida após o fim da ditadura, mas lamentou que ainda subsistam manifestações autoritárias que, a seu ver, ocorrem porque os crimes contra a humanidade nunca são esclarecidos.
Nas transições da ditadura para a democracia "os estados têm a obrigação de cumprir os preceitos de justiça integral, o que inclui o esclarecimento da verdade, a aplicação da justiça para os violadores dos Direitos Humanos e a reparação ou indenização das vítimas".
No Brasil não houve um processo de estabelecimento da verdade, e por isso "as garantias de não repetição (das violações dos DH) são precárias", advertiu Oprimi.
Na quinta-feira testemunhou o ex-procurador brasileiro Belisário dos Santos, integrante da comissão que investigou o paradeiro dos desaparecidos no Araguaia, sem maiores resultados, devido à falta de colaboração dos chefes militares.
Belisário dos Santos disse que, graças ao trabalho da comissão, foi indenizado um importante número de vítimas ou suas famílias, mas admitiu que não se pôde cumprir com a expectativa dos parentes, que é achar os restos dos desaparecidos e identificar os responsáveis por sua morte.
A Corte também ouviu o testemunho de Laura Petit da Silva, cuja irmã Lúcia foi executada extrajudicialmente em 1972 e cujos restos não foram encontrados até 1996.
Laura relatou que, durante os 24 anos que durou a busca de sua irmã, "não houve qualquer disposição de colaborar por parte de nenhum agente do Estado" e, ao contrário, os esforços da polícia para obter justiça sofreram obstáculos.
Os parentes das vítimas são representados pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), cuja diretora executiva, Viviana Krsticevic, criticou a falta de cooperação das autoridades e tribunais brasileiros.
CEJIL recordou que as resoluções da ONU e a jurisprudência de tribunais internacionais foram claras a respeito das leis de anistia que não podem ser alegadas como razão para não investigar o paradeiro de desaparecidos políticos.
Também não podem ser evocadas para uma negativa de identificar e castigar os autores de graves violações dos direitos humanos, afirmou Krsticevic.
Uma vez finalizada a audiência desta sexta, será aberto um período para a recepção e incorporação à causa de alegações por escrito até 21 de junho, depois do que a Corte emitirá uma sentença em um prazo ainda não estabelecido.
Fonte: Agence France-Presse
Um comentário:
Tia Nina, qual a sua opinião crítica sobre a decisão do STF em considerar os crimes de lesa-humanidade abarcados dentro da "ampla e irrestrita" Lei de Anistia? Estamos falando de algo tão importante par ao nosso país, e não vejo ninguém dar a menor relevância ao assunto. É notinha de rodapé de jornal. Matérias sobre a moda inverno tem mais espaço do que a Lei de Anistia. Eu procuro e não acho quem questione, quem queira debater isso,quem se revolte com a vitória dos torturadores e a derrota - não apenas das famílias que perderam entes queridos durante a diratura, mas da nossa Constituição. A decisão foi mais política do que técnica, penso eu. Daria um bom debate, mas infelizmente vivemos num país em que a maioria das pessoas nem sabe o que é "anistia". As pessoas não querem saber. E mais uma vez empurramos pra debaixo do tapete mais um episódio vergonhoso da nossa história. Como explicar para os jovens nas escolas que um dia nós decimos esquecer e perdoar torturadores? Por duas vezes?
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